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Terroristas implantam ditadura na Síria

Por Ricardo Rabelo

A Síria é uma nação marcada historicamente pela dominação externa e pela instabilidade política e militar. Em 24 de outubro de 1945, a Síria conquistou sua independência como uma república parlamentar e tornou-se membro fundador da Organização das Nações Unidas, encerrando formalmente o antigo domínio francês, ainda que as tropas francesas tenham permanecido no país até abril de 1946.

O período que se seguiu à independência foi conturbado, com vários golpes de estado e tentativas de golpes ocorrendo entre 1949 e 1971. Entre 1958 e 1961, a Síria uniu-se brevemente ao Egito, uma união que terminou com o golpe de estado de 1961. A República Árabe Síria foi estabelecida no final de 1961 após um referendo realizado em 1º de dezembro, mas a nação continuou a enfrentar instabilidade até o golpe de estado de 1963, quando o Partido Baath assumiu o poder.

Durante cinquenta e três anos, a Síria foi governada pelo Partido Baath. Primeiro por Hafez al-Assad, que esteve no poder de 1971 a 2000, e depois por seu filho Bashar, que governou por vinte e quatro anos.

O regime de Assad chegou ao fim em dezembro de 2024, após uma invasão de cerca de 20 mil terroristas que tomaram a cidade de Idlib. O exército sírio, que contava com aproximadamente 200 mil soldados e uma infraestrutura militar estabelecida, não enfrentou a invasão, mesmo tendo passado quase quinze anos em uma violenta guerra civil que causou a morte de mais de 500 mil pessoas. Suspeita-se que os Estados Unidos corromperam amplamente os oficiais do exército, além de realizarem um ataque hacker que impediu a comunicação com as tropas. Não houve resistência também por parte dos países aliados, como Rússia, Irã e Hezbollah. As versões sobre essa vitória dos terroristas sem resistência por parte do governo de Bashar são contraditórias e não explicam claramente o ocorrido.

Como discutimos em um artigo anterior, a Síria está atualmente dividida em várias regiões dominadas por potências estrangeiras, como Israel, EUA e Turquia, tornando difícil prever a extensão do poder do novo governo liderado pelos terroristas do HTS.

A ditadura

Em 29 de janeiro, o Departamento de Operações Militares do governo de fato na Síria anunciou que Abu Mohammad al-Julani, líder do HTS, assumirá a presidência do país durante a chamada “fase de transição”. O novo presidente passará a ser conhecido como Ahmad Al Sharaa, um nome que ele adota frequentemente.

Essa decisão instaurou uma ditadura total na Síria. O porta-voz do Hayat Tahrir al-Sham (HTS), o grupo jihadista que liderou a derrubada de Assad e que surgiu como uma divisão da Al Qaeda, declarou que “todas as facções militares e órgãos revolucionários políticos e civis estão dissolvidos e integrados às instituições do Estado”.

Ele também anunciou “a formação de um novo aparato de segurança para preservar a segurança dos cidadãos” e a “reconstrução do exército sírio”. Esse governo, fruto de uma operação imperialista coordenada pelos EUA e Israel, com a participação da Turquia, Qatar e Ucrânia, decretou a “suspensão” da constituição do país e a dissolução do Partido Baath, da Assembleia do Povo, do exército nacional, dos serviços de segurança e de todas as facções armadas, incluindo o próprio HTS de Sharaa.

Como é possível que esses violentos terroristas, que tomaram o governo da Síria através de uma invasão militar, decretem a dissolução total das instituições democráticas do Estado Sírio sem qualquer manifestação de repúdio dos governos ocidentais que se dizem democráticos? As decisões autoritárias foram tomadas em uma ilegal “Conferência para anunciar a vitória da revolução síria”, na qual estavam presentes os chefes militares que participaram da tomada do poder em dezembro de 2024.

De acordo com a imprensa ocidental, o governo recém-anunciado deverá ceder o poder a uma nova administração em março. O ditador Sharaa previu que pode levar até três anos para finalizar a nova constituição da Síria, deixando a convocação de eleições indefinida por enquanto. Ou seja, a ditadura se auto outorgou pelo menos quatro anos de poder absoluto, sem a existência de congresso, judiciário, partidos ou qualquer instituição minimamente independente do governo.

Uma ditadura de ocupação estrangeira

O Catar foi um dos primeiros países a anunciar seu apoio. O governo monárquico e autoritário do país emitiu um comunicado saudando “medidas para reestruturar o Estado sírio e promover o consenso e a unidade entre todas as suas partes”. Participou da chamada “Conferência da Vitória” Ahmad al-Hayes, também conhecido como Abu Hatem Shaqra, líder da facção Ahrar al-Sharqiya da força do Exército Nacional Sírio (SNA), apoiada pela Turquia – uma organização responsável por vários crimes de guerra.

                    Todos os membros do novo governo têm uma trajetória em grupos terroristas e uma grande parte dele são estrangeiros, de acordo com informações do site The Cradle. O autoproclamado presidente e líder do HTS, Ahmad al-Sharaa, teve uma breve passagem pela faculdade de mídia antes de ingressar na faculdade de medicina da Universidade de Damasco. No entanto, ele abandonou os estudos para se juntar à Al-Qaeda no Iraque (AQI) após a invasão dos EUA em 2003. Seu histórico inclui ser o ex-vice do chefe do ISIS, Abu Bakr al-Baghdadi, quando o grupo terrorista era conhecido como Estado Islâmico do Iraque (ISI). Em 2011, Baghdadi enviou Sharaa para lutar contra o governo de Assad na Síria, onde ele participou de ataques suicidas mortais contra agentes de segurança e civis antes de fundar a Frente Nusra em 2012.

A Frente Nusra, braço oficial da Al-Qaeda no Levante, continuou a aterrorizar os povos sírio e libanês por anos sob a liderança de Sharaa. Durante seu tempo no Iraque, Sharaa começou como membro da AQI, responsável por muitos ataques indiscriminados, incluindo bombardeios de locais religiosos e a morte de civis e fiéis, com o objetivo de desencadear uma guerra sectária. Em 2008, ele foi misteriosamente libertado da prisão em Camp Bucca, administrada pelos EUA. Sharaa serviu como emir de Mosul do ISI, período durante o qual ocorreram muitos assassinatos e sequestros, muitos deles executados por ele próprio.

A ditadura implantada na Síria pelos terroristas não tem relação com a Síria. O novo exército sírio é composto principalmente por líderes estrangeiros. Sharaa declarou que os militares estrangeiros “devem ser celebrados” como “parte do movimento que levou à queda de Assad”. Ele também afirmou que os combatentes estrangeiros que permanecem na Síria receberão a cidadania síria.

Um exemplo dessa presença estrangeira é o militante uigur chinês, Abdulaziz Dawood Khudaberdi, do Partido Islâmico do Turquestão (PIT), que foi nomeado brigadeiro-general do novo exército sírio. O PIT é uma organização terrorista uigur que luta sob o comando do HTS há anos. Seus membros entraram ilegalmente na Síria após 2011, assim como dezenas de milhares de outros combatentes estrangeiros de várias nações que vieram ao país para lutar contra o governo derrubado pelos terroristas.

O PIT busca estabelecer um Estado islâmico em regiões da China e é visto por Pequim como uma organização terrorista violenta, uma séria ameaça aos seus interesses e segurança. Outros dois combatentes uigures, Mawlan Tarsoun Abdussamad e Abdulsalam Yasin Ahmad, foram nomeados coronéis.

O cidadão turco Omar Mohammed Jaftashi e o cidadão jordaniano Abdul Rahman Hussein al-Khatib também foram nomeados generais de brigada. Além disso, o terrorista tadjique Saifiddin Tojiboev, procurado em seu país natal, o Tadjiquistão, por pertencer a organizações terroristas e recrutar militantes extremistas, foi nomeado coronel.

A lista de estrangeiros no exército sírio não para por aí. Abdul Jashari, um extremista albanês, agora detém o posto de coronel. Omar Mohammed Jaftashi, um cidadão turco, foi nomeado general de brigada.

Shadi Mohammad al-Waisi, nomeado ministro da Justiça em dezembro, foi juiz da Frente Nusra e é formado em Sharia islâmica. Recentemente, surgiram vídeos verificados de Waisi supervisionando a execução pública de mulheres acusadas de prostituição e adultério em 2015, não atraindo condenação suficiente e passando despercebidos na grande mídia. É claro que o ministro da Justiça não será levado à justiça por seus crimes.

Murhaf Abu Qasra, também conhecido como Abu Hassan 600, foi nomeado ministro da Defesa após a queda do governo de Assad. Ele é bacharel em engenharia agrícola, é um dos principais líderes da ala militar do HTS há vários anos e foi responsável pela unidade de drones do grupo, conhecida como Brigadas Shaheen. Ao assumir seu papel como ministro da Defesa, surgiram relatos sobre o envolvimento de Abu Qasra em vários crimes e atrocidades: 20 assassinatos premeditados, 15 assaltos à mão armada, 12 amputações, 150 execuções de xiitas, cristãos e ateus, 15 casos de apedrejamento até a morte e 10 casos de estupro de mulheres cativas.

Anas Hassan Khattab, cofundador da Frente Nusra ao lado de Sharaa e do novo ministro das Relações Exteriores da Síria, Asaad Hassan al-Shaibani, foi nomeado chefe da inteligência síria. Khattab, também conhecido como Abu Ahmed Hudood, foi colocado na lista negra como terrorista pelo Conselho de Segurança da ONU em setembro de 2014 por sua estreita associação com a Al-Qaeda, particularmente com a AQI. De acordo com a lista, ele esteve por vários anos envolvido no financiamento, planejamento, facilitação, preparação ou perpetração de atos ou atividades da Frente Nusra.

Como parte dos esforços para promover a inclusão, Aisha al-Debs foi nomeada chefe de Assuntos da Mulher. Ela possui um mestrado em administração de empresas pela Universidade de Damasco. Embora não se saiba muito sobre ela, Debs, uma cidadã turco-síria que viveu na Turquia por dez anos, declarou de forma honesta durante uma entrevista recente como planeja realizar seu trabalho. Ela afirmou: “Não vou permitir espaço para aqueles que diferem de mim ideologicamente”. Debs também disse que as mulheres são “as principais responsáveis por suas famílias, maridos e prioridades”. Segundo ela, o novo governo da Síria pretende “criar um modelo adequado à realidade e às circunstâncias das mulheres sírias”, que seria baseado na Sharia islâmica.

A rotina no novo governo sírio

Militantes em Aleppo incendiaram o local de descanso e o santuário de “al-Hassan bin Hamdan al-Khasibi”, considerado uma das figuras mais importantes da seita alauíta, e executaram várias pessoas que se abrigavam ali, acusando-as de serem do Exército Árabe Sírio. No primeiro mês do governo do HTS, 150 alauítas foram mortos, centenas de pessoas foram presas e submetidas à tortura e os cristãos foram expulsos da cidade de Maaloula. Árvores de Natal foram queimadas em praças públicas e vídeos circularam mostrando alauítas sendo humilhados e forçados a latir como cães. Militantes do HTS se filmaram espancando um adolescente alauíta, com vários homens adultos atacando um menino desarmado. É muita coragem!

A ditadura terrorista implanta reformas neoliberais 

O governo sírio tem realizado um programa econômico tipicamente neoliberal. Já tomou providências para realizar  amplas privatizações de empresas estatais e há notícias de um número gigantesco de demissões de funcionários públicos. Vários ministros da equipe do  presidente Ahmad al-Sharaa disseram que estão dedicados a reduzir o tamanho do Estado com a remoção de milhares de funcionários improdutivos.

O ministro interino das Finanças, Basil Abdel Hanan  disse que  o novo governo vai dar prioridade ao crescimento do setor privado, e desenvolver programas sociais para os setores mais desfavorecidos das população. Hanan ganhou como ministro da Economia na administração liderada pelo HTS em Idlib. Nessa época o grupo terrorista angariou recursos cobrando altos impostos da população, tendo cobrado inclusive taxas sobre a ajuda humanitária fornecida pela ONU. Matérias publicadas na imprensa árabe em 2022 mostraram os terroristas do HTS desviando centenas de milhões de dólares para a Turquia, expropriando recursos da ajuda humanitária para disponibilizá-las no mercado clandestino. A ditadura síria  quer que a indústria síria funcione fornecedora de exportações globais.

Há informações de que cresce a indignação em toda Síria pela politica opressiva desenvolvida pelo novo governo, havendo inclusive manifestações contra o governo. Há uma grande reação também a uma grande quantidade de assassinatos e execuções sumárias realizadas por bandos armados a mando do Departamento de Operações Militares do governo ditatorial. Segundo o ditador Sharaa, os assassinatos são considerados normais e podem continuar por dois ou três anos, conforme relatos de  setores bem-informados da população síria.

O apoio do imperialismo é total à ditadura terrorista Síria

Os governos ocidentais estão avançando rapidamente para suspender as sanções econômicas que devastaram a economia da Síria por mais de uma década. Um setor do Fundo Monetário Internacional (FMI) afirmou que o fundo está monitorando de perto a situação e está pronto para apoiar os esforços da comunidade internacional na reconstrução síria, conforme necessário e quando as condições permitirem.

O governo espanhol celebrou o fato de que “a Espanha está voltando para a Síria depois de mais de doze anos”, hasteando a bandeira vermelha e branca na embaixada espanhola em Damasco, fechada após o início da guerra de 2011, organizada pelo Pentágono e pelos serviços secretos dos EUA e seus aliados com suas redes de jihadistas do Oriente Médio.

O ministro das Relações Exteriores espanhol, Albares, visitou a prisão de Sednaya em Damasco e ecoou o que chama de “horror do regime de Bashar al-Assad”, condenando a violação dos direitos humanos. No entanto, ele deixou de mencionar os massacres cometidos durante a guerra pelas forças jihadistas de Ahmed al-Sharaa e a repressão que estão realizando atualmente. O jihadista com quem Albares se encontrou é o mesmo terrorista que jurou lealdade à Al-Qaeda. Ele foi responsável por  ter aterrorizado a população do norte da Síria, traficado drogas nos territórios que controlava e que se tornou um instrumento da sangrenta intervenção dos Estados Unidos e da Turquia na Síria, que desde 2011 causou mais de quinhentas mil mortes no país. Albares também não percebe que os Estados Unidos continuaram a manter ilegalmente milhares de soldados em solo sírio por anos, e o governo de Sánchez, sempre pronto a reivindicar soberania e integridade territorial para alguns países, não emitiu a menor condenação à ocupação militar dos EUA no norte da Síria, nem ao roubo de seu petróleo.

Apesar de o gabinete de Sánchez ainda não reconhecer o governo de Maduro na Venezuela e recusar-se a romper relações diplomáticas com Israel, mesmo diante de um massacre horrível de dezenas de milhares de palestinos, tem sido diligente em obedecer às instruções de Washington.

Os Estados Unidos começaram a reconhecer tacitamente o novo regime jihadista na Síria com a visita do conselheiro para o Oriente Médio, Daniel Rubinstein, e da chefe do Departamento de Estado para a região, Barbara Leaf, que se reuniu com Al-Sharaa em Damasco. Seu objetivo, junto com Israel e com a obediência submissa da União Europeia, é controlar a transição e o novo regime sírio, impondo um novo diktat no Oriente Médio.

Após essa visita dos EUA a Damasco, os ministros das Relações Exteriores da França, Jean-Noel Barrot, e da Alemanha, Annalena Baerbock, também o visitaram, reconhecendo oficialmente o governo jihadista, assim como Kaja Kallas, a extrema-direitista estoniana encarregada da diplomacia e vice-presidente da União Europeia. Kallas frequentemente usa linguagem inflamatória contra Moscou, mas é sempre solícita e amigável com Washington. A União Europeia enviou também a comissária belga Hadja Lahbib para se encontrar com Al-Sharaa em Damasco, onde anunciou a entrega ao regime jihadista de um “pacote de ajuda” de 235 milhões de euros e a reabertura da sua delegação na Síria, contrastando com as duras sanções econômicas que Bruxelas impôs ao governo de Bashar al-Assad.

Nós, trabalhadores brasileiros, devemos nos solidarizar com o povo sírio que, assim como os do Líbano e da Palestina, sofre com o terror imposto do exterior pelos agentes do imperialismo. Devemos denunciar a dura repressão e os massacres que a ditadura jihadista síria está cometendo. Também devemos exigir que o governo brasileiro se posicione contra a ditadura terrorista da Síria e pelo fim da ocupação militar da Síria pelos EUA, Turquia e Israel.

Além disso, a esquerda deve propor uma iniciativa conjunta para exigir a condenação imediata da ditadura síria, o fechamento da embaixada em Damasco durante o período da ditadura terrorista, a retirada das forças americanas, turcas e israelenses que ocupam partes da Síria e a denúncia do governo sanguinário imposto ao povo sírio.

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