Por Ricardo Rabelo
Drones ucranianos atingiram bases aéreas em toda a Rússia em 1º de maio num ataque coordenado conhecido como ‘Operação Teia de Aranha’, visando locais de Murmansk, no Ártico, a Irkutsk, na Sibéria. Kiev afirmou que cerca de 40 aeronaves militares russas foram danificadas ou destruídas, incluindo bombardeiros de longo alcance Tu-95 e Tu-22. Moscou não confirmou as alegações, relatando que a maioria dos drones de Kiev foi abatida. Os ataques foram supostamente realizados usando caminhões comerciais equipados com drones carregados de explosivos que haviam sido contrabandeados para dentro da Rússia.
A operação deslanchada por Kiev envolveu pilotar drones a milhares de quilômetros das linhas de frente o que é possível e concebível apenas com o apoio de um poderoso sistema de comunicações por satélite. Como os ucranianos não têm esse domínio, se eles foram capazes de agir remotamente, certamente foi graças à colaboração estreita de quem tinha esta capacidade – os Estados Unidos.
Apesar de sua natureza espetacular, a ‘Operação Teia de Aranha’ não mudará o equilíbrio tático de poder no terreno ou o curso da guerra, porque os aviões destruídos não são usados no campo de batalha. Porque, então, a Ucrânia envolveu tanto tempo e recursos nessa ação? Um objetivo seria, talvez, político, de mostrar a Rússia como estrategicamente fraca, a ponto de não conseguir proteger seus bombardeios nucleares. Outro alvo seria mostrar que é possível fazer esse tipo de operação sem despertar a atenção da inteligência russa e que esta venha a agir de forma a impedir a ação.
Um aspecto importante, que não foi detectado pela imprensa ocidental é que esta foi uma ação retardada do Governo Biden, pois teria se iniciado há um ano e meio atrás, período em que Biden ainda era o presidente dos EUA. Seria possível que o serviço de inteligência norte americano prosseguiu esta operação mesmo já no período Trump, sem que o atual governo fosse informado? Tudo indica que sim. É evidente que o Governo Trump já não consegue governar os EUA, tal a resistência da população às peripécias de seu governo. A imprensa não noticiou, mas Elon Musk saiu do governo porque não conseguiu levar a frente seu projeto de desmantelar o Estado norte americano, que continua sob o mando de forças do imperialismo “oficial” do país, para o qual Trump é uma carta fora do baralho.
A reação da Rússia
Moscou condenou veementemente os contínuos ataques de drones da Ucrânia em território russo nas últimas semanas, alegando que eles prejudicam os esforços diplomáticos em andamento para acabar com o conflito. O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, afirmou que os últimos ataques são uma tentativa de atrapalhar o processo de paz.
Enfrentando pesadas perdas no campo de batalha, o “regime ilegítimo de Kiev” recorreu à organização de ataques terroristas para tentar intimidar a Rússia, disse o presidente Vladimir Putin.
Os recentes atos de sabotagem ferroviária nas regiões russas de Bryansk e Kursk foram “sem dúvida um ato terrorista”, disse Putin. Ele acrescentou que “as decisões de realizar tais crimes foram, é claro, tomadas na Ucrânia” pela liderança política.
“O ataque à população civil foi intencional” Putin disse. “E isso apenas confirma nossa preocupação de que o regime já ilegítimo de Kiev, que uma vez tomou o poder, está gradualmente se transformando em uma organização terrorista, e seus patrocinadores estão se tornando cúmplices de terroristas.”
“Hoje, em meio a pesadas perdas e recuos ao longo de toda a linha de contato, a liderança de Kiev passou a organizar atos terroristas na tentativa de intimidar a Rússia”, Putin disse.
Apesar disso, acrescentou, as autoridades ucranianas estão solicitando uma pausa nos combates e propondo reuniões no mais alto nível. “Mas como essas reuniões podem ser realizadas nessas condições?” Putin disse. “O que há para falar? Quem conduz negociações com aqueles que confiam no terror – com terroristas?”
O líder russo enfatizou que “o poder, para o regime [de Kiev], é aparentemente mais importante do que a paz, mais importante do que as vidas humanas”.
O regime terrorista de Kiev
Na proposta de cessar fogo permanente colocada na reunião pelos representantes da Rússia, consta a determinação que, após 100 dias do cessar fogo devem ser realizadas eleições gerais na Ucrânia , do parlamento e do presidente, para instalar ali um governo realmente legítimo do país. Ou seja, a Rússia identifica o governo de Zelensky como um governo ilegítimo, o que ele realmente é. A ditadura de Kiev é um dos regimes mais arbitrários e corruptos da história da Ucrânia. Além de ter eliminado fisicamente os inimigos ou lideranças que poderiam lhe disputar o poder, o regime instalou uma máquina feroz no governo e tem continuado a exterminar os seus oponentes. Além disso é sabido que uma verdadeira organização criminosa se implantou nas estruturas de poder, responsável pelo desvio e venda de quantidades ilimitadas das armas dos EUA ou da Europa, que chegaram a destinos como África ou Ásia, tornando milionários não só Zelenski mas a alta cúpula do governo. Sabe-se que Zelenski possui mansões em Toscana, na Itália e em outros países da Europa.
A posição dos EUA em disputa
A posição de Trump é bem distinta dos herdeiros de Biden situados nos vãos do Deep State norte americano. Trump tem alertado que se retirará das negociações sobre a Ucrânia se nenhum progresso for feito, e muitas pessoas argumentam que essa seria a melhor coisa para acabar com a guerra se de fato os EUA se retirassem da guerra junto com ele. A Europa tem demonstrado que pretende continuar apoiando Kiev e não se sabe se, dentro da OTAN, suas vozes seriam predominantes, mesmo com a oposição dos EUA.
Nesta situação, os EUA não enviariam mais armas para a Ucrânia nem compartilhariam suas estruturas de inteligência e cibernéticas. Isso significa que ações como essa dentro da Rússia não aconteceriam mais, pois não teriam os dados de direcionamento que apenas os Estados Unidos podem fornecer. Além disso os Estados Unidos têm patrulhas AWAC que conseguem monitorar o espaço aéreo ucraniano e direcionar sua defesa aérea para contra-ataques de mísseis, bombas e drones russos.
Haveria uma situação de superioridade russa sobre a Ucrânia que seria bastante catastrófica para as forças ucranianas. Nessa situação Trump seria obrigado a mudar de estratégia, ou haveria uma séria crise política, com possibilidade até de deposição do presidente. Sua defesa de uma aproximação com a Rússia para romper sua aliança com a China já não impressiona o “establishment” norte americano. Provavelmente a maioria em Washington já se opõe à distensão entre os Estados Unidos e a Rússia.
É uma guerra sobre a arquitetura de segurança da Europa, sobre o lugar da Rússia nessa arquitetura e sobre o lugar da Ucrânia nessa arquitetura. E isso significa que esta guerra não pode ser resolvida facilmente promovendo um acordo bilateral entre a Rússia e a Ucrânia.
Portanto, os Estados Unidos estão diretamente envolvidos neste conflito geopolítico maior que está em andamento. E não pode ser resolvido sem o envolvimento direto dos EUA, sem o envolvimento direto entre Washington e Moscou para abordar questões geopolíticas centrais.
A retaliação da Rússia
O grande problema é que o ataque da Ucrânia afetou a estratégia de segurança nuclear da Rússia. Alguns argumentaram que não havia proteção para os bombardeios nucleares, que estavam expostos abertamente. A explicação para isso é que as disposições do Novo Tratado START (o Acordo de Controle de Armas Estratégicas entre a Rússia e os Estados Unidos) exigem que essas armas, esses bombardeiros, sejam exibidos abertamente em aeródromos para que os satélites do outro lado possam confirmar que cada lado cumpre as limitações numéricas. O problema é que a Ucrânia aproveitou essa exibição exigida pelos acordos de controle de armas entre os Estados Unidos e a Rússia para atacar um elemento da tríade nuclear da Rússia. Se a Rússia não retalia o ataque, isso reforçará as percepções que a Rússia não implementa suas próprias advertências sobre linhas vermelhas e que a Ucrânia e o imperialismo podem agredir a Rússia com total impunidade.
A Rússia revisou sua doutrina de uso nuclear no ano passado e disse explicitamente que ataques de uma nação não nuclear a serem realizados com o apoio de um estado nuclear poderiam ser motivo para o uso de armas nucleares pela Rússia. Eles acrescentaram que, se esses ataques pudessem interromper as capacidades nucleares da Rússia, isso também se qualificaria para o uso de armas nucleares pela Rússia. Então eles moveram suas linhas vermelhas de forma bastante explícita e transparente. Portanto, o ataque a aeronaves estratégicas parece ser exatamente esse tipo de situação do ponto de vista da Rússia.
A proposta da Rússia na mesa de negociações deixou claro o que está em jogo. A primeira opção para um cessar-fogo deve ser a retirada total das Forças Armadas regiões ucranianas do Donbass, Kherson e Zaporizhia, no prazo de 30 dias; o reconhecimento internacional da Crimeia, do Donbass e da Novorossiya como parte da Rússia; a neutralidade da Ucrânia; a realização de eleições pela Ucrânia e a subsequente assinatura de um tratado de paz, aprovado por uma resolução juridicamente vinculativa do Conselho de Segurança das Nações Unidas; e a proibição do recebimento e implantação de armas nucleares.
A Ucrânia, ou seja, a organização terrorista com sede em Kiev, dificilmente aceitará isso. Até agora a Rússia manteve estas negociações com Kiev sob impulso dos EUA. O ataque os seus bombardeios nucleares agora dá a justificativa que a Rússia precisava para abandonar as negociações. E para uma retaliação muito forte, que mostre para Kiev as portas do inferno em que ela terá que viver se as negociações fracassarem. O povo russo clama, segundo o analista Pepe Escobar, que Putin “liberte os Oreshniks” misseis hipersônicos devastadores que só a Rússia tem. Se essa retaliação não convencer a Ucrânia do lugar onde ela se encontra, a guerra vai prosseguir com uma escalada muito mais rápida da Rússia, que pode chegar até Kiev. O que tem o risco de desencadear uma guerra frontal com os EUA, ou remover Zelensky do poder e ser um caminho para se retomar negociações reais que possibilitem um acordo de paz. Os EUA não poderão reclamar que a Rússia derrube Zelensky do poder, ela simplesmente aprendeu com o mestre dos golpes em todo o planeta…
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