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Jornal Info no. 18

Nicarágua Hoje: Independência, Democracia  e Desenvolvimento

                                                                                                                          Prof. Dr. Ricardo F. Rabelo

Após a derrota da tentativa de Golpe de 2018 pela reação da população e do Governo contra os golpistas, a Nicarágua se transformou e evoluiu muito em relação ao período em que, aparentemente, a Revolução Sandinista parecia ter sido derrotada. Apesar de toda uma campanha difamatória, hoje a Nicarágua é um país que preza sua soberania e conseguiu iniciar um processo de libertação, econômica e política da dominação dos EUA. Nesse artigo pretendemos mostrar  esta nova era da Revolução Sandinista, tanto do ponto de vista interno como das relações internacionais. Mostrar, também, que é um país onde vigora uma democracia plena, onde os direitos do povo são respeitados  e priorizados em detrimento da burguesia.

  1. Uma democracia popular e revolucionária

Com a aproximação das eleições nicaraguenses de 2021 os EUA tentaram organizar os poucos traidores da revolução que ainda atuavam na tentativa de destruir as conquistas da Revolução Sandinista para uma nova aventura golpista. Para isso criaram várias estratégias e programas que utilizavam esses traidores como instrumento. Foram  carreados para o país milhões de dólares, destinados a financiar órgãos de imprensa e ONGS para uma campanha de desestabilização do regime sandinista. O governo conseguiu identificar as movimentações financeiras deste grupo, e rastreou suas iniciativas golpistas.

No segundo semestre de 2021 o Governo desencadeou uma operação visando a defesa da Revolução Sandinista e para impedir que houvesse mais uma ação de guerra híbrida contra o povo e o governo da Nicarágua como aconteceu em vários países como o Brasil em 2015-16 e na Ucrânia em 2014. Se prosperasse seus resultados poderiam ser tão ou mais funestos que as ações de 2018.  De acordo com  as leis  nicaraguenses, que condenam liminarmente todo aquele utilize de recursos estrangeiros para prejudicar seu próprio pais, como , de resto , também fazem os EUA, foram presos cerca de 400   “opositores”  para impedir que continuassem a organizar um novo golpe.

Entre eles estavam conhecidos políticos responsáveis pela quase destruição do país no período 1990-2006, como os membros da famosa família Chamorro que sempre tiveram como pátria os EUA, e só participaram da Revolução para defender seus interesses econômicos ameaçados pelas iniciativas dos Somoza utilizando o aparelho de Estado para criar empresas monopolistas em vários setores. Além desses, desponta o grupo que se chamava Movimento  Renovador Sandinista (MRS) mas que depois se tornou  Unamos (União Democrática Renovadora) , tirando até do nome do grupo político a referencia à revolução sandinista. Entre eles está Dora Telles, que ostenta o passado revolucionário, mas que foi uma das mais aguerridas lideranças das ações golpistas desencadeadas em 2018. 

 Estes prisioneiros de guerra começam agora a ser julgados de acordo com as leis nicaraguenses,  pois  foram descobertos canalizando milhões de dólares da NED, USAID e possivelmente até da própria CIA para  tentar impedir ou perturbar as eleições de 7 de novembro de 2021, ou  disseminar através da mídia  internacional    a pretensa  nulidade de seus resultados. Assim fazendo, beneficiam os EUA  que não admitem, como ficou claro  na Guerra contra a Rússia, que qualquer país desafie seus interesses. Entre as evidências coletadas até agora, através dos dados das próprias ONGs e Fundações, ficou clara não só as ligações financeiras como também a intensa comunicação  entre os mercenários e os seus financiadores, como foi divulgado pelo Wikileaks. Vale acrescentar que, no caso dos contrarrevolucionários que se apresentaram como dissidentes da FSLN, o fazem para enganar os incautos , já que vários anos se passaram desde seu abandono da própria Revolução e a submissão de suas  organizações às orientações políticas emanadas dos EUA.

Fracassaram em 2018, o império entrou em declínio, seus seguidores não construíram uma referência política, e as famílias renomadas que quiseram passar por mártires, com a propaganda através do monopólio capitalista de imprensa, passaram pelo ridículo de ver descoberta a utilização de recursos estrangeiros que faziam de forma clandestina. 

Uma das razões pelas quais os Estados Unidos ficaram particularmente furiosos com a prisão dos líderes golpistas é porque Washington havia claramente feito planos para repetir a estratégia golpista de nomear um Juan Guaidó como o chamado “presidente interino” da Venezuela. Funcionários do governo dos EUA e seus aliados centro-americanos de direita sugeriram que planejavam reconhecer a oligarca Cristiana Chamorro como a “presidente interina” de um regime  paralelo na Nicarágua. Quando ela foi presa por lavagem de dinheiro em junho, isso frustrou seu novo plano de desestabilização.

Sobre a prisão de membros da Igreja Católica

 Na primeira semana de agosto, as autoridades nicaraguenses desmantelaram a rede de mídia (cinco emissoras de rádio e um canal de televisão local) de propriedade de Rolando Álvarez. Álvarez é bispo de Estelí e Matagalpa, mas também é um ator político, um dos líderes envolvidos na violenta tentativa de golpe de 2018, e se propôs a criar um clima de confronto para desestabilizar o governo da Nicarágua diante das eleições municipais  em novembro.

Os meios de comunicação privados de Álvarez foram fechados porque estavam sendo usados para lavar dinheiro usado no financiamento de ativistas que  incitavam  a violência nas ruas como parte das tentativas de Álvarez de desestabilização do governo . Após o fechamento de seus meios de comunicação, Álvarez, que resistiu a ordem de prisão, juntamente com padres e seminaristas, foi colocado em prisão domiciliar enquanto está sendo investigado por uma série de crimes. No entanto, mesmo após sua prisão, Álvarez continuou a fomentar a violência que ameaçava a segurança da população de Matagalpa. Para a segurança da cidade, ele foi transferido para prisão domiciliar em Manágua, onde permanecerá enquanto estiver sendo investigado; e onde  está recebendo visitas de sua família e do cardeal, com quem conversou longamente. Foram presos também , na mesma ocasião,  os padres José Luis Díaz, Ramiro Tijerino, Raúl González e Sadiel Eugarrios, além dos seminaristas Darvin Leyva e Melquín Sequeira e do cinegrafista Sergio Cárdenas que estavam junto com o Bispo Álvarez.

Existe perseguição religiosa na Nicarágua?

A perseguição religiosa é definida como ataques sociais ou institucionais a pessoas especificamente por suas crenças religiosas. O que vimos em eventos recentes na Nicarágua é a investigação e prisão de pessoas que infringiram a lei, independentemente de suas crenças religiosas. Isso não é perseguição religiosa.

Não só não há perseguição religiosa na Nicarágua, mas há um ambiente de expressão religiosa florescente.  Enquanto a mídia internacional publicava histórias de perseguição religiosa, dezenas de cidades e vilas nicaraguenses se dedicam a celebrar seus santos católicos em festas apoiadas financeira e logisticamente pelos governos municipais.  Mas a maior festa de todas foi a de dezenas de milhares de pessoas que caminharam e dançaram livremente pelas ruas de Manágua em duas festividades dedicadas a Santo Domingo.

As Eleições presidenciais

As eleições de 7 de Novembro de 2021 transcorreram normalmente, apesar da grande campanha que fizeram contra elas os EUA e a União Europeia. A votação na frente composta pela Frente Sandinista e vários outros partidos e movimentos foi quase o dobro da obtida  em 7 de novembro de 2006. Houve mais de 65% de participação e 76% de apoio à FSLN representando um triunfo para o sandinismo e para o próprio país. .

Esta é a maior taxa de participação registrada na América do Norte, América Central, América do Sul e Europa, confirmando a existência de um  sentimento comum entre governantes e governados. A votação veio como consequência do que foi feito no país desde 2006: o mais formidável, amplo e extenso projeto de modernização e desenvolvimento do país com ampla inclusão social. Enquanto isso, de Washington, o presidente dos EUA, Joe Biden, descreveu as eleições como uma farsa e pantomima, “que não era livre nem justa, e certamente não democrática”. Os EUA e a União Europeia (UE) desqualificaram separadamente essas eleições. Biden, cujo governo, como a UE, sancionou o círculo íntimo de Ortega, para aumentar a pressão sobre o presidente centro-americano. Seguindo a linha de Washington e Bruxelas, a mídia corporativa internacional espalhou uma série de falsas alegações sobre as eleições de 2021 na Nicarágua, dizendo incorretamente, por exemplo, que o governo proibiu partidos antissandinistas, que prendeu candidatos da oposição ou que a afluência às urnas foi muito baixa.

Entre as mais absurdas dessas alegações estava a de que a Nicarágua impediu a participação de partidos da oposição e fechou as assembleias de voto. Isso é simplesmente falso. Houve um total de sete alianças diferentes que participaram das eleições de 2021 na Nicarágua: cinco partidos de oposição nacional (todos de direita), outro partido de oposição regional na costa do Caribe e, finalmente, a aliança de esquerda liderada pela Frente Sandinista, que  foi composta por nove partidos.

  Em contraste com as palavras desabonadoras de Biden, o presidente venezuelano Nicolás Maduro parabenizou Ortega por sua previsível vitória e reiterou que a Nicarágua tem alguém para defendê-la. O deputado Dmitry Novikov, número dois do Partido Comunista da Rússia, presente nas eleições, criticou aqueles que asseguravam que não reconheceriam os resultados das eleições antes mesmo de terem  sido realizadas.

Ortega, que também governou o país em 1980, depois que a FSLN derrubou o sanguinário ditador Anastasio Somoza em 1979, enfrentou cinco candidatos, em eleições nas quais 4,4 milhões de eleitores tiveram direito a voto, convocados para eleger também 90 deputados do Congresso.

Embora o governo da Nicarágua tenha impedido a OEA de enviar observadores devido ao seu papel no golpe boliviano de 2019, em 7 de novembro estavam presentes 165 observadores eleitorais e 67 jornalistas de 27 países. Membros das delegações dos EUA e do Canadá que observaram as eleições, realizaram uma entrevista coletiva durante a qual o processo eleitoral  foi caracterizado como “eficiente, transparente, com ampla participação cidadã e representação dos partidos políticos”. Apesar da rejeição dos EUA e da OTAN aos resultados das eleições, 153 nações soberanas ao redor do mundo apoiaram a democracia nicaraguense ao reconhecer os resultados das eleições nas Nações Unidas. 

Em 10 de janeiro de 2022 o comandante Daniel Ortega iniciou seu quarto mandato presidencial na presença de delegações internacionais representando 21 países, e mais de 300 representantes de partidos e movimentos da Europa, Estados Unidos e América Latina.

Estavam presentes à solenidade Nicolás Maduro, presidente da Venezuela,  Miguel Díaz Canel, presidente de Cuba. Estavam presentes também  os ex-presidentes da Guatemala e El Salvador e, sobretudo, os ministros da China, Rússia e Irã, que vêm testemunhar a importância da Nicarágua no quadro  latino americano. Destaque especial foi dado à presença do Vice-Presidente da Assembleia Popular Chinesa (Parlamento), enviado especial de Xi, com quem a Nicarágua, reatou relações diplomáticas ainda em 2021.

2 – Um modelo de desenvolvimento oposto ao neoliberalismo

De acordo com o Banco Central  nicaraguense  a economia da Nicarágua cresceu mais de 9% em 2021, uma das melhores taxas de crescimento das Américas. A Nicarágua cresceu cerca de 5% em média de 2007 ao início de 2018, quando ocorreu a tentativa de golpe apoiada pelos EUA. Naquele ano, o PIB caiu cerca de 2%, mas em 2021 o PIB atingiu um recorde de US$ 13,85 bilhões. 

De acordo com o Centro de Procedimentos de Exportação (CETREX), as exportações cresceram, em 2021,  22%, atingindo US$ 3,6 bilhões e chegando a US$ 6,6 bilhões se consideradas as exportações das Zonas Francas. Os investimentos estrangeiros captados foram 65% maiores do que em 2020. Em 2021, o investimento estrangeiro nas Zonas Francas foi de US$ 70 milhões com a abertura de sete novas empresas nos departamentos de Estelí, Manágua e Matagalpa. 

O Banco Mundial e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento relatam que o emprego na Nicarágua já se recuperou aos níveis pré-pandemia. O  Banco Mundial informou que a Nicarágua concluiu desembolsos de US$ 99 milhões em cumprimento de projetos, a uma taxa de desembolso de 53%; sendo a quantidade e a taxa, números recordes nos últimos 10 anos que colocam a Nicarágua entre os 10 primeiros do mundo. 

Investimento em infraestrutura pública

O Banco Mundial informou  que a Nicarágua ocupa o terceiro lugar no mundo no desenvolvimento de fontes de energia renovável, com 70% de sua produção proveniente de fontes renováveis. O Banco também afirma que desde 2007 a Nicarágua vem implementando um programa de eletrificação que triplicou a produção de energia a partir de fontes renováveis e ampliou a cobertura de eletricidade de apenas 54% em 2007 para 99% em 2021. Dentro de alguns anos a Nicarágua deixará de lado a dependência de combustíveis fósseis. 

A Aliança Estratégica para a Medição do Investimento Público em Infraestrutura (INFRALATUM),  no relatório intitulado “Investimento Público em Infraestrutura Econômica na América Central”.,   observa que a Nicarágua ocupa o terceiro lugar na América Latina (depois da Bolívia e Belize) em investimento em infraestrutura. 

O Orçamento  de 2022 segue as diretrizes do Programa Nacional de Combate à Pobreza e Desenvolvimento Humano 2022-2026.Nele,  23% é destinado à educação, 22,2% à saúde e o restante aos programas de proteção social. As prioridades incluem o acesso a serviços de saúde e educação de qualidade em todos os níveis.

Entre 2007 e 2021, o governo investiu mais de um bilhão de dólares para levar água potável e saneamento às pessoas como um direito humano e não como um negócio. Em 2006 apenas 65% da população urbana tinha água potável; hoje é 91,5%. Em 2021, 28 projetos de água potável e saneamento foram executados com sucesso.

O número de instalações desportivas duplicou desde 2007, quando eram 1.015, hoje são 2.030. Há planos para a construção de 13 estádios de beisebol e 13 de futebol, 12 centros esportivos e a construção ou melhoria de cinco grandes centros recreativos semelhantes ao impressionante Parque Luis Alfonso Velázquez, em Manágua. Em outubro, foi concluída a construção de um novo e importante cais em Bilwi, Região Autônoma do Caribe Norte da Nicarágua. 

O governo implantou a primeira Universidade Agrícola Indígena da América Latina na Região Autônoma do Sul do Caribe. Essa iniciativa é única na região, pois oferece capacitação e educação profissional a indígenas e afrodescendentes, ensinando-os a ler e escrever em sua língua materna por meio do programa “Yo Sí Pod”.

O privilégio da saúde gratuita

Dado o que sabemos sobre como a estabilidade e a qualidade de vida da maioria podem melhorar a economia em geral, talvez em vez de nos perguntarmos “como um país pobre como a Nicarágua pode garantir assistência médica gratuita à sua população?” Nós realmente deveríamos estar nos perguntando: “Como um país rico como os Estados Unidos pode se dar ao luxo de NÃO fazer isso?”

Um dos hospitais mais bem equipados do país, o Hospital Fernando Vélez Paiz, foi construído e inaugurado em 2018. Nele  pacientes com emergências não urgentes esperam no máximo 30 minutos para serem atendidos pelos médicos, e os pacientes esperam no máximo um mês para cirurgias não urgentes. Há quatro torres de laparoscopia fazendo cirurgias de vesícula biliar 24 horas por dia, todos os dias. Nos Estados Unidos  essa cirurgia custaria 54.000 dólares  mas é grátis na Nicarágua.

Em Ciudad Sandino há vinte anos, o hospital era  incapaz de fornecer até mesmo os serviços mais básicos para uma comunidade de 180.000 habitantes. Na época, pacientes em hospitais públicos não só tinham que pagar tudo, mas um paciente estaria mais seguro em casa: os hospitais estavam em condições tão precárias, sem funcionários, leitos e até higiene básica, que costumava-se dizer que os hospitais eram onde os pacientes iam para morrer.

Graças ao investimento público em infraestrutura de saúde, ao aumento de pessoal, ao aprimoramento e especialização da formação de pessoal e ao trabalho incansável de envolver comunidades e famílias em sua própria saúde, Ciudad Sandino conta hoje com sete unidades de saúde e um hospital que inclui ambulatório, internação e consulta de emergência, maternidade, serviços de reabilitação e fisioterapia, centro de medicina natural e centro de cirurgia de catarata, e todos os serviços são gratuitos. Melhorias comparáveis ocorreram em todo o país: a mudança na vida das pessoas é palpável e os resultados na saúde geral são mensuráveis. Com a construção de Maternidades em todo o país, a mortalidade materna diminuiu de 92,8 para 32,9 óbitos por 100.000 nascidos vivos durante o mesmo período. As mortes por câncer do colo do útero caíram 25% e a expectativa média de vida aumentou.

Foram construídos  24 novos hospitais desde 2007. Em apenas dez anos os gastos sociais passaram de 10% para 57% do orçamento do país. 

Em março de 2021, a Nicarágua iniciou a vacinação contra a COVID-19 para pessoas com problemas de saúde e maiores de 60 anos. Então, em setembro, quando grandes quantidades de vacinas começaram a ser recebidas, a vacinação em massa começou 24 horas por dia em todo o país. A vacinação casa a casa começou em novembro, medida que vem sendo implementada contra outras doenças, como a poliomielite. Devido a isso, no início de dezembro a população acima de 30 anos estava coberta com a vacina em 80%. 

A Nicarágua fechou 2021 com a melhor rede hospitalar da América Central. Mais de 100 novos centros de saúde foram construídos, incluindo dez hospitais: 6 hospitais primários e 4 hospitais departamentais. Outros dez foram reconstruídos ou ampliados. Dezenas de clínicas e postos de saúde também foram construídos. Os hospitais Prinzapolka e Waspam, no norte do Caribe, danificados pelos furacões de 2020, estão quase reconstruídos. 

As brigadas médicas comunitárias fizeram centenas de milhares de visitas de casa em casa. O Ministério da Saúde informou que a mortalidade infantil diminuiu de 29 óbitos por 1.000 nascidos vivos em 2006 para 12,8 em 2021. A desnutrição infantil crônica em menores de cinco anos diminuiu de 21,7% para 9,3%. O diagnóstico e tratamento do câncer melhorou enormemente, relatando a realização de 22.200 endoscopias e 15.700 ultrassons para a detecção de câncer de estômago e próstata. 

Os números mostram que não só a economia nicaraguense mas também a qualidade de vida da maioria da população do país melhorou. Se em 2006 o PIB per capita era de 990 dólares, em 2018 subiu para 2.300 dólares. “A política econômica da Nicarágua poderia ser descrita como “economia popular”: garante o acesso básico à saúde, educação, terra, mercados, financiamento, etc.

O contraste com o período Chamorro é evidente: durante seu governo de 1990-1997, foi imposto o modelo neoliberal liderado pelos Chicago Boys de Milton Friedman, que tentava se livrar de todas as conquistas sociais promovidas pelo sandinismo.

Isso significou o desmantelamento do setor estatal, a imposição de um programa de austeridade e a privatização dos  serviços de saúde, educação, fornecimento de água e esgoto, o que levou o país à falência. Em 1997, a inflação atingiu 13.490%; a pobreza subiu para 70%; o desemprego  em 60% e o analfabetismo, que foi reduzido pelo governo sandinista de 50% em 1979 para 13% em 1990, aumentou para 35% em 1997.Tão servil foi o governo Chamorro que em 1992 perdoou Washington pela decisão da Corte Internacional de Justiça das Nações Unidas que obrigou os EUA a indenizar a Nicarágua com 17 bilhões de dólares por 38.000 vítimas civis e pela destruição da infraestrutura do país durante a guerrilha dos Contras..

Educação pública e gratuita para todos  

O triunfo da Revolução Popular Sandinista permitiu que os trabalhadores da Nicarágua se libertassem do domínio de Somoza. Em 1979, a taxa de analfabetismo era de 53% e foi reduzida para 12% com a Cruzada Nacional de Alfabetização  em 1980.

A grande Cruzada Nacional de Alfabetização tirou milhares de nicaraguenses do analfabetismo e forneceu  os instrumentos a conscientização necessários e libertação  do  povo.

Em 1990, após sofrer uma guerra de agressão imposta pelo governo dos Estados Unidos onde morreram mais de 50.000  cidadãos  nicaraguenses, o neoliberalismo voltou ao governo. A partir de então, por 16 anos, os governantes perderam o interesse por uma educação libertadora e permitiram que o analfabetismo crescesse, como base fundamental da exploração dos operários e camponeses. O neoliberalismo privatizou a educação e a saúde, além de outros setores essenciais, mas houve resistência e o retorno dos sandinistas  ao governo em 11 de janeiro de 2007.

Desde 2007, a realidade educacional foi radicalmente transformada com a decretação do ensino gratuito na rede pública. Ocorreu a retomada do caminho iniciado pela Cruzada Nacional de Alfabetização desenvolvida na década de 1980, agora através do programa de alfabetização “Eu posso” de  Cuba, que reduziu o analfabetismo para abaixo de 5%. Além disso  há  o  acompanhamento permanente por meio das ações da Secretaria de Educação de Jovens e Adultos do Ministério da Educação.

De acordo com o Resumo Cooperativo do UNICEF (2019 – 2023), entre 2010 e 2016 a taxa média de matrícula de meninos e meninas de 4 a 6 anos aumentou de 54,5% para 65,1%. No ensino primário ultrapassou os 100% e no ensino médio passou de 67,9% para 76,5% . Neste ano de 2022, 1 milhão e 800 mil alunos iniciaram o ano letivo na Nicarágua 

Além disso, continuam sendo concedidas bolsas de estudo em todos os níveis, dezenas de milhares de profissionais dos setores populares são formados graças à política inclusiva de educação gratuita e de qualidade com acesso para todos; promove-se a educação popular e técnica para os trabalhadores  do campo e da cidade, resgatam-se as raízes populares e indígenas da cultura nacional. A Nicarágua é um dos poucos países latino-americanos que produz todos os livros didáticos de que necessita em todos os níveis e que são distribuídos gratuitamente a 100% das crianças das escolas públicas, tanto no campo como na cidade. Os subsistemas de formação básica, secundária e de professores, educação técnica e profissionalizante, educação superior, educação extracurricular e educação autônoma regional foram integrados na Costa do Caribe.

A educação pública, gratuita e de qualidade, com acesso para todos, é a plataforma para que o povo construa seu conhecimento. A educação voltou a ser a principal ferramenta que os trabalhadores tem para enriquecer e fortalecer a cultura e a arte. A invasão cultural, destruidora da identidade nacional, é um problema real que  ameaça  os povos da América Latina..

Por isso, o objetivo é possibilitar que  se tenha  educação e  consciência populares  capazes de identificar os ataques dos inimigos da pátria e ter a inteligência para garantir estratégias de resistência que continuem a garantir as vitórias do povo.

A situação atual exige uma luta para garantir a  construção de aprendizagens significativas que impliquem uma interiorização consciente e assim garantir as ferramentas necessárias para atuar, também de forma consciente, em cada conjuntura.

“Nossa batalha de ideias não cessará enquanto existir o sistema imperialista, hegemônico e unipolar, transformado em um flagelo para a humanidade e uma ameaça mortal à sobrevivência de nossa espécie. Nossa mensagem chegará a todos os cantos da Terra, e nossa luta será um exemplo. O mundo, cada vez mais ingovernável, lutará até que o hegemonismo e a subjugação dos povos sejam totalmente insustentáveis”. (Comandante Fidel Castro)

3-  Relações Internacionais: Soberania Ativa e Altiva

Em 9 de novembro, a OEA anunciou oficialmente que havia rejeitado os resultados eleitorais da Nicarágua, chamando-os de “ilegítimos”. Essa declaração foi publicada quase exatamente dois anos depois que a OEA fez o mesmo na Bolívia, espalhando falsas acusações de “fraude” para justificar um golpe militar contra o presidente socialista Evo Morales, eleito democraticamente.

Em um claro reflexo de suas segundas intenções, no mesmo dia em que denunciou as eleições nicaraguenses, a OEA realizou um “Fórum do Setor Privado” no qual empresas estrangeiras foram convidadas a investir na América Latina. A conferência neoliberal resumiu perfeitamente as prioridades da OEA, que apoia as corporações norte-americanas enquanto orquestra golpes na América Latina. Entre seus participantes mais notórios estava o na época  presidente de extrema direita da Colômbia, Iván Duque, que só chegou ao poder graças a um esquema ilegal de compra de votos de um traficante chamado Ñeñe Hernández, por ordem do chefão político Álvaro Uribe, um aliado próximo de Washington.

Em 19 de novembro, após a reeleição do presidente Daniel Ortega, o governo nicaraguense anunciou sua retirada da Organização dos Estados Americanos (OEA), dominada pelos Estados Unidos, unindo-se à Venezuela e Cuba no que o ex-presidente boliviano Evo Morales chamou de “um ato de dignidade.” Em carta oficial ao Secretário-Geral da OEA, Luis Almagro, o chanceler da Nicarágua, Denis Moncada, reiterou a condenação anterior da OEA como um “instrumento de ingerência e intervenção” com a “missão de facilitar a hegemonia da Estados Unidos com seu intervencionismo contra os países da América Latina e do Caribe”.

A  OEA produziu um relatório de 16 páginas dentro de 48 horas das supostas “eleições ilegítimas” que não continham nenhuma evidência de fraude no dia da eleição. Paralelamente à afirmação perversa e ridícula da Casa Branca de apoiar o “direito inalienável à autodeterminação democrática do povo nicaraguense”, a falsa narrativa de Almagro sobre a fraude que promove o golpe veio diretamente do manual dos EUA/OEA usado durante sua facilitação do Golpe de 2019 contra o partido MAS de Morales na Bolívia. 

Enquanto Cuba, Venezuela e outros líderes de esquerda na América Latina parabenizaram a Frente Sandinista e Ortega por sua vitória, alertando para os esforços de desestabilização dos EUA, há uma nova geração de líderes reformistas liberais, cultivados por ONGs na região, que se alinham com o imperialismo .No Chile, Gabriel Boric condenou os sandinistas e afirmou sua solidariedade  com a oligarca de direita Cristiana Chamorro, descendente da dinastia mais poderosa da Nicarágua e filha de Violeta Barrios de Chamorro, a primeira presidente neoliberal para tomar o poder após a Revolução Sandinista, graças a uma massiva campanha de intromissão da CIA.

Da mesma forma, o Ministério das Relações Exteriores do Peru emitiu um comunicado denunciando as eleições na Nicarágua. Foi um sinal do enfraquecimento do presidente progressista recém-empossado, Pedro Castillo, cujo ministro das Relações Exteriores orgulhosamente anti-imperialista Héctor Béjar foi forçado a renunciar pelas Forças Armadas apenas algumas semanas depois de assumir o cargo. Béjar alertou que a demissão forçada e a tomada do Ministério das Relações Exteriores pelo exército e pela direita foi “um golpe de Estado suave ou começo de um”.

Assim, enquanto as forças progressistas estão desfrutando de um ressurgimento em partes da América Latina, a esquerda também está dividida entre os anti-imperialistas revolucionários e os  social-democratas apoiados por ONGs e  mídia internacional que cumprem os desígnios do imperialismo estadunidense.

O reatamento das relações diplomáticas, econômicas e políticas com a China

Em 9 de dezembro  de 2021, a Nicarágua restabeleceu relações diplomáticas com a China.  Esta importante decisão deve ser entendida como uma questão de segurança nacional para o desenvolvimento do país. Os investimentos da China podem ser usados para modernizar a infraestrutura de transporte terrestre, aéreo e portuário.

O crescimento econômico sem precedentes da República Popular da China e sua vontade de usar seus recursos para financiar projetos de desenvolvimento econômico no “terceiro mundo” é uma ameaça direta à hegemonia capitalista neoliberal, pois a China oferece às nações em desenvolvimento uma alternativa às armadilhas da dívida predatória lançado por instituições de crédito ocidentais como o Banco Mundial e o FMI.

Poucas semanas após a retomada das relações diplomáticas entre a Nicarágua e a República Popular da China, o representante do governo chinês, Yu Bo, convidou a Nicarágua a se juntar à Iniciativa do Cinturão e Rota. O ministério das Relações Exteriores da Nicarágua, respondeu ao convite com aprovação.  Esta aliança econômica bilateral traz um potencial suporte para que o novo governo  possa voltar aos avanços anteriores a abril de 2018. O presidente  Ortega afirmou  que ” o s nicaraguenses também podem estar confiantes de que o desenvolvimento econômico em aliança com os chineses não virá por meio da renúncia à soberania nacional por meio de programas de ajuste estrutural neoliberal  unilaterais ou do gangsterismo da armadilha da dívida”.

Com o apoio da economia que mais cresce no mundo, com uma população de 1,4 bilhão, além de uma série de outros governos e movimentos de solidariedade, a Nicarágua ganhou a capacidade de liderar uma carga mais agressiva contra a segurança militarizada proposta por Washington juntamente com desenvolvimento neoliberal como modelo para a América Central. Esse modelo que visa enriquecer as corporações através do investimento privado e da austeridade em detrimento dos pobres e da classe trabalhadora continua sendo a antítese das revoluções chinesa e sandinista. Durante seu discurso de posse, o presidente Ortega elucidou esse ponto chave, afirmando que “a revolução chinesa e a revolução sandinista [têm] o mesmo norte, o mesmo caminho, o mesmo destino, que é acabar com a pobreza”.

Como o processo de alívio da pobreza contraria os objetivos exploradores dos imperialistas ocidentais, os EUA e a UE impuseram medidas coercitivas unilaterais coordenadas contra funcionários da Nicarágua no dia da posse do presidente Ortega. No entanto, a implacável estratégia de guerra híbrida usada para isolar e punir “estados inimigos” como a Nicarágua perdeu parte de seu impacto. “O mundo unipolar acabou. É um mundo multipolar”,. A derrota pelo  povo nicaraguense nas tentativas de mudança de regime dos EUA nos últimos três anos é uma conquista notável que ajudou a mudar o paradigma para um mundo multipolar. No entanto, é importante reconhecer os inevitáveis sacrifícios que a resistência implica.

O restabelecimento das relações entre os governos da China e da Nicarágua dá as condições para acelerar o projeto do Grande Canal Interoceânico, paralisado no país centro-americano como resultado do golpe fracassado de 2018.Em junho de 2013, a Assembleia Nacional da Nicarágua aprovou a Lei 840, para a concessão, construção e operação do Grande Canal Interoceânico concedido a um grupo de capital chinês HKND, por um custo aproximado de 50 bilhões de dólares, com capacidade para a travessia de mais de 5.000 navios por ano.

O interesse em construir um canal interoceânico remonta ao século passado, e o atual governo da Nicarágua aposta em um grande projeto de construção para posicionar a nação centro-americana no centro do comércio do continente, dada a limitada capacidade do atual Canal do Panamá.

.              O que acontece é que desde 1948 os norte-americanos tentam impedir a construção do canal, porque sabem que a libertação económica dos povos leva à independência política.

A possibilidade de os Estados Unidos aumentarem as hostilidades na política internacional contra a Nicarágua não afetará uma decisão  política e soberana do governo  sobre o novo vínculo com Pequim e a renúncia de Manágua às relações com Taiwan.

As relações entre o presidente Daniel Ortega e a China remontam à década de 1980, quando a Revolução Popular Sandinista triunfou na Nicarágua e o então presidente era aliado do gigante asiático. No entanto, os laços foram rompidos pela ex-presidente Violeta Barrios quando chegou ao poder em 1990, para estabelecê-los com Taiwan.

Projeção internacional

Em termos de política internacional, destaca-se a entrada de Nicaragua no projeto chinês da Nova Rota da Seda, que proporciona um novo caminho para o comércio internacional que é o maior plano de infraestruturas jamais concebido na historia da humanidade. Do ponto de vista de Manágua, a adesão ao projeto chinês, além de reduzir decisivamente a dependência dos EUA  para suas importações-e exportações, acarreta por si só um aumento significativo do coeficiente de valor da Nicarágua no cenário internacional. Por outro lado, reduz a agressividade dos Estados Unidos, da OEA e da UE.

Para Manágua, o resultado é imediato e prospectivo: no momento, o mercado chinês é um possível novo rumo para suas exportações, enquanto no curto e -médio prazo, a associação com o projeto de Pequim constitui a inserção do país centro-americano em um projeto multilateral de enorme importância, projetando o governo de Ortega a uma dimensão decididamente superior à conhecida até agora.

Existe a consciência de que o mercado chinês representa agora uma alternativa importante aos EUA e à Europa. Isso pode gerar sanções americanas e europeias e a hostilidade de seus aliados latino-americanos, mas não   abala o progresso econômico do país.

Não é apenas uma questão de importação e exportação. O acesso a créditos internacionais, cuja suspensão foi ameaçada pelos Estados Unidos através do Nica Act assume, no entanto, hoje, um aspecto completamente diferente. Pequim oferece a possibilidade de usar seus bancos sem ter de aceitar a hipoteca das políticas socioeconômicas internas propostas pelo Banco Mundial, FMI e BID. Ganha-ganha, ou interesse mútuo, é a única condição. Portanto, o pesadelo  do fim do crédito que circula pelas potências ocidentais não faz mais sentido.

Não se trata de otimismo ideológico, nem de leituras descontextualizadas: a China já tem um pé no continente latino-americano e pretende continuar seu caminho de crescente influência econômica. A inclusão da Nicarágua (e em breve de Honduras) em seus projetos ampliaria os investimentos comerciais no subcontinente latino-americano, do qual já participam Brasil, Venezuela, Equador, Argentina e Chile, com 652 projetos financiados com 75 bilhões de dólares de Pequim

A Nicarágua sandinista se emancipou da influência das organizações patronais que, no entanto, representam apenas 30% do PIB, enquanto os 70% restantes são trabalho do Estado e da economia familiar. Mas os danos causados à economia e à sociedade nicaraguenses não são esquecidos, e o comandante Ortega leva em conta a traição da burguesia oligárquica aos interesses nacionais. 

No contexto internacional, as ameaças dos Estados Unidos tornaram-se palavras inúteis. A reabertura das relações diplomáticas com Pequim abriu caminho para um novo horizonte econômico, composto por infraestrutura, comércio e acesso a créditos internacionais, que serão decisivos para continuar e vencer a guerra declarada pela Nicarágua contra a pobreza e a desigualdade. 

Interesses mútuos

Com a abertura do mercado chinês, a distribuição das exportações nicaraguenses está assegurada e a ameaça de bloquear as exportações para  Manágua se curvar ao domínio do imperialismo  é inócua.

A reabertura de relações com a China, neste quadro, assume aspecto tanto tático quanto  estratégico. A tática é limitar bastante o impacto das sanções comerciais que foi decidida tanto pela OEA quanto pelos Estados Unidos com a Lei Renacer, e replicada pela União Europeia. No plano estratégico  a China, além de dar cobertura política ao mais alto nível,  tem um interesse decididamente significativo na questão dos  investimentos que deve fazer na Nicarágua. Além disso, está em andamento um acordo político-militar com a Rússia, principal aliado da Nicarágua.

Para continuar sustentando o ritmo de desenvolvimento nos níveis em que se projeta sua economia, a China precisa de alimentos e energia, e a Nicarágua, a seu modo, pode sem dúvida cumprir uma função adequada às necessidades da China. Em segundo lugar, a possibilidade de reabrir o debate sobre o canal interoceânico projetaria o papel da Nicarágua como líder da região centro-americana e, com ela, o da China como potência mundial capaz de ter um caminho privilegiado na via de comunicação entre dois oceanos. , o Pacífico e o Atlântico. Do ponto de vista estratégico, isso é de extraordinária importância para ambos.

A  abertura do mercado chinês e dos bancos chineses à Nicarágua transforma as ameaças americanas em algo inócuo. A lei Renacer com a qual os Estados Unidos pensavam que poderiam dobrar Manágua, com a assinatura de um protocolo diplomático, tornou-se um texto estéril. A exibição de poder tornou-se uma manifestação de impotência.

Luta de classes e resistência socialista:

O Congresso dos EUA, inclusive os deputados considerados  “progressistas” votaram pela Lei Renacer. A Lei Renacer é uma lei viciosa destinada a minar a capacidade do governo nicaraguense de proteger os direitos humanos de seu povo e punir o povo por ter a temeridade de apoiar seu governo e seu projeto anticolonial. Também amplia a supervisão dos empréstimos das instituições financeiras internacionais a Manágua e pede que se revise a participação da Nicarágua no acordo de livre-comércio entre Estados Unidos, América Central e República Dominicana.

A lei também incluiu a Nicarágua na lista de países centro-americanos sujeitos a restrições de visto por “corrupção” e exige mais informações de inteligência sobre as atividades do governo russo naquele país centro-americano, incluindo relatórios sobre as vendas militares de Moscou a Manágua.

Os Estados Unidos impuseram sanções econômicas à vice-presidente da Nicarágua, Rosario Murillo, mulher de Ortega, e a três filhos do casal nos últimos anos, bem como a titulares do Banco Central, da Polícia e do Exército, e cancelaram vistos de uma centena de funcionários nicaraguenses por “corrupção” e “abuso dos direitos humanos”.

Por que Nicarágua, Cuba e Venezuela representam uma ameaça existencial para os Estados Unidos? Por que eles são capazes de unir todas as alas do Partido Democrata e do Partido Republicano contra estes países?

Isso se resume a dois fatores. Primeiro, mostrar para os outros países que eles não devem construir projetos independentes e autodeterminados que priorizem as necessidades materiais e os interesses do povo sobre os do capital. Em segundo lugar, a política de luta de classes do estado norte-americano.

A reafirmação da doutrina racista de Monroe pelo ex-conselheiro de segurança nacional dos Estados Unidos, John Bolton, não foi repudiada pelo governo Biden porque também é a estrutura orientadora de suas políticas. A referência à Doutrina Monroe nada mais era do que conectar essa doutrina com sua expressão política contemporânea refletida na doutrina de dominação “Full Spectrum” que tem sido a política externa bipartidária dos Estados Unidos por vinte anos. A ideia central dessa política é que qualquer nação que tente desafiar os Estados Unidos e construir um projeto independente que ameace a hegemonia dos Estados Unidos em qualquer região do mundo será destruída.

O fato de que Nicarágua, Cuba e Venezuela não estejam apenas tentando construir projetos independentes, mas construir o socialismo torna seu exemplo ainda mais ameaçador.

 A mera existência dessas nações neste momento histórico, um momento caracterizado por contradições profundas e irreversíveis e pela atual crise da ordem capitalista representa uma ameaça ideológica potencialmente grave. Se essas nações relativamente pobres podem construir moradias públicas e eliminar os sem-teto, oferecer educação gratuita, assistência médica universal e garantir que ninguém passe fome, podem construir estruturas democráticas com o direito protegido de participação popular, coloca em  questão o capitalismo estadunidense onde esses tipos de direitos são inatingíveis para o povo dos Estados Unidos. Essa realidade ameaça a classe dominante dos bilionários capitalistas e eles não podem permitir esse desafio.

Nicarágua, Cuba e Venezuela estão tentando construir um socialismo comprometido com uma estrutura de justiça social  que nada tem a haver com  concepção liberal, individualista, e formal  dos direitos humanos defendida pelos EUA. Já os países sancionados pelos EUA defendem direitos realmente humanos, que refletem o mais alto compromisso com a dignidade humana universal e a justiça social que indivíduos e coletivos definem e asseguram para si mesmos por meio da luta social.

Essa abordagem dos direitos humanos vê os direitos humanos como uma arena de luta que, quando fundamentada nas necessidades e aspirações dos oprimidos, torna-se parte de uma estratégia abrangente e unificada de descolonização e mudança social radical.