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Boletim Econômico Ecosys no. 10

Vitória de Lula: a necessária superação do modelo econômico neoliberal

 Prof. Dr. Ricardo F. Rabelo

A grande vitória nas eleições presidenciais obtida pelo conjunto da população oprimida, pelos trabalhadores, jovens, mulheres e negros  consagrou, com a eleição de Lula,  uma mudança importante na correlação de forças na sociedade brasileira. O Governo Lula deve ser uma coroação desse processo, com retomada do novo modelo econômico e social implementado no segundo mandato do Governo Lula em 2006, em oposição ao modelo neoliberal adotado por todos os outros governos antes e depois do Governo Lula. Foi a vacilação nesta luta fundamental que fez o Governo Dilma fracassar, abrindo o flanco para o ascenso do movimento golpista que culminou com o impeachment em 2016.

A questão do modelo Econômico

Essa retomada deverá se dar já agora, na montagem do  governo, tendo a principalidade na definição da equipe econômica, que deve ser ocupada por um representante das lutas desenvolvidas no último período contra o neoliberalismo, pela afirmação de um novo projeto de desenvolvimento que coloque a prioridade no desenvolvimento econômico autônomo e independente, com base no desenvolvimento de um novo setor estatal na economia e na supervisão e controle do desenvolvimento industrial pelo governo.  Sabemos que somente a mudança do eixo de desenvolvimento do país do chamado agronegócio e voltado para a exportação de produtos agropecuários e minerais, para um novo eixo de desenvolvimento voltado para a indústria e de um forte setor econômico estatal é que pode efetivamente alterar o padrão de acumulação hoje vigente no país, fruto da política econômica adotada pelo regime golpista e fascista que se instalou no país a partir de 2016.

Uma Nova Política Industrial

Uma nova política industrial deve ser implantada para possibilitar o estancamento do processo de desindustrialização do país e reprimarização de nossa  pauta de exportações. A recuperação e reimplantação de um setor estatal como núcleo dinâmico da economia deve ser uma tarefa que se dê prioridade, pois a economia brasileira não suporta mais um período de uma sucessão de desastres econômicos gerados pela política econômica neoliberal. A retomada da refinarias privatizadas da Petrobrás e a reestatização da Eletrobras são fundamentais para a reversão do modelo neoliberal para um modelo de desenvolvimento nacional e popular. Mas a principal questão da industrialização se dá também no terreno da Ciência e Tecnologia. Nós já estamos na quarta revolução industrial, centrada na automação, cibernética e inteligência artificial. Não é possível pensar o desenvolvimento do país apenas com base na indústria automobilística de motor a combustão e nas indústrias de bens de consumo durável do ramo eletroeletrônico O país já tinha um certo know-how na área de alta tecnologia, com a Embraer e o setor de pesquisa tecnológica da Petrobras que foram privatizados e deixaram de ter o papel que tinham. Chegamos a ter uma fábrica de semi condutores que foi criminosamente fechada pelo governo atual. Isso sem falar da  perda da base de Alcântara para os EUA, que era um Centro de desenvolvimento de tecnologia Espacial  e que  foi entregue de graça para os EUA.

A questão da Ciência e Tecnologia: parceria estratégica com a China

É preciso que uma das prioridades da reindustrialização do Brasil se dê na reestruturação do setor de pesquisa científica , a partir da criação de um Instituto de Tecnologia Avançada nos moldes do que foi feito na China, de base estatal. E na retomada da nossa tradição na área, com quadros brasileiros que estão no país, principalmente nas Universidades Federais,  ou fora dele. Aliás a parceria com a China deve ser reformulada, para projetos fundamentais na área de infraestrutura e no desenvolvimento industrial, e não mais ficando o país na função de exportador de produtos primários para a China e importador de produtos manufaturados daquele país. A China não é , estruturalmente , um país imperialista, mas a relação econômica da China com o país reproduz, a partir do golpe de 2016, com a implantação selvagem do modelo neoliberal, as relações imperiais que antes eram características da nossa submissão ao imperialismo britânico e estadunidense. É preciso que o governo desenvolva projetos importantes e fundamentais na parceria com a China, que o próprio Xi Jinping anunciou como estratégica, dentro do projeto da Nova Rota da Seda. É necessária a implantação de uma malha ferroviária em todo o país, com trens dinâmicos e modernos, que integrasse o pais tanto para transporte de passageiros como de carga. Isso nos libertaria do peso que o transporte rodoviário tem sobre a economia do país, cuja ineficiência e perigo político ficaram claros nas recentes greves dos caminhoneiros. Isto já está sendo feito em parcerias da China com países da Ásia que possuem maiores problemas estruturais e  níveis de desenvolvimento comparativamente iguais ou menores que o do Brasil.

O problema da Fome

Outra questão definida como estratégica para o governo é a do enfrentamento e eliminação do problema da fome. Não se vai resolver esta questão sem mudanças na estatura fundiária do país,  eliminando totalmente o latifúndio e dando condições de produção(terra, implementos agrícolas, orientação técnica) para o trabalhador sem terra ou o produtor em regime de minifúndio. Outro problema sério e mais recente é a venda indiscriminada de terras a estrangeiros, facilitada pela mudança legislativa patrocinada pelo Governo Bolsonaro. Para criar condições desta mudança, é preciso uma política efetiva de reforma agrária , a partir da reativação dessa função pelo INCRA, de preferência  com a criação também  de um Ministério da Reforma Agrária, combinando a política de reconstrução do sistema de fiscalização e regulação destruídos pelo Governo Bolsonaro  com uma política de assentamento cada vez maior e mais rápida, para reverter os processos de concentração fundiária e o avanço do crime organizado na tomada de  terras  da União ou como resultado da grilagem de terras produtivas de pequenos produtores. É evidente que uma verdadeira política de reforma agrária só poderá ser efetivada com a mudança da estrutura fundiária, que altere profundamente  o regime de propriedade privada da  terra no país. Isso é impossível com o atual Congresso, e só pode se dar no caso de uma mudança da correlação de forças que pode ser gerada em um movimento de massas, amplo e democrático por uma Assembleia Nacional Constituinte.

A Política Nacional de combate à fome

Para o encaminhamento de uma política nacional de combate à fome não basta a retomada do Programa de Bolsa Família, mesmo que com um valor maior que 600,00 pois acrescenta o valor de acordo com o número de filhos até 6 anos. O problema está na estrutura de produção de alimentos do país, baseada na pequena ou micro propriedade, e pautada por baixa produtividade, escala diminuta e grande controle do preço final pelo sistema de transporte/distribuição e pelo  comércio varejista. É preciso reconstruir a atuação reguladora e de supervisão do comércio de alimentos pelo Estado, para impedir que um pequeno grupo de grandes transportadores  e empresas de supermercados  estabeleça, arbitrariamente, o preço dos produtos necessários para sobrevivência da população. É preciso que sejam recriados grandes armazéns estatais  dos alimentos básicos, com a função de regular o mercado, impedindo que a especulação ou os fatores sazonais continuem determinando se a população consiga ou não  consumir o montante vital de calorias, proteínas, vitaminas, etc. E é preciso criar, pelo menos em cidades com um volume maior populacional e que não haja possibilidade de suprir com autoconsumo suas necessidades básicas, armazéns que atuem diretamente na venda de produtos de uma cesta básica, como a rede abastecer no município de BH, mas de propriedade do Estado.. Finalmente, o estabelecimento de uma política de preços máximos de produtos básicos do consumo popular, nos moldes da antiga SUNAB (Superintendência Nacional de Abastecimento e Preços), como um órgão do governo federal. É preciso romper o circulo vicioso de salários rigidamente controlados pela política de salários mínimos e preços de alimentos e outros produtos necessários à sobrevivência da população absolutamente livres. É preciso também uma política salarial, que seja negociada com as Centrais Sindicais , para estabelecer o valor mais realista para o salário mínimo. É evidente que seu atual valor, fruto da política salarial dos governos golpistas, que abandonaram a política estabelecida pelos governos do PT, que garantiu o aumento real dos salários, não condiz com a realidade da vida da maioria da população que recebe atualmente o salário mínimo.

Como se sabe ,  o salário mínimo necessário para manter uma família de quatro pessoas deveria ser de R$ 6306,97 (Setembro de 2022) ,  segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico). O cálculo leva em consideração a cesta básica mais cara do Brasil e o cumprimento da determinação constitucional que estabelece que o salário mínimo deve ser suficiente para suprir as despesas de um trabalhador e da família dele com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência. No atual valor do salário mínimo, de R$ 1212,00 o trabalhador gasta mais de 50% com consumo de alimentos da cesta básica.

A questão da participação popular

Finalmente, se coloca a questão da participação popular. O próprio presidente Lula apontou a questão central, que é a do Orçamento. Para garantir que o Orçamento Público seja retomado como Orçamento do Governo e não como Orçamento do Congresso, devem ser extintos o chamado orçamento secreto e o orçamento Impositivo, que obriga o Governo a aceitar e não alterar as emendas parlamentares. O orçamento nas mãos do Congresso e não do Governo é uma anomalia que deve ser sanada, pois a eleição de Lula, que condenou esta estrutura orçamentária, torna a continuidade desta situação totalmente ilegítima. Como dificilmente o Congresso irá, voluntariamente, extingui-lo, será necessária uma ampla mobilização popular contra ele. Uma opção seria a busca de sua declaração , pelo STF, de sua flagrante inconstitucionalidade, mas isso não se dará como benesse da justiça, mas apenas como fruto de mobilização social.

Outra proposta do presidente Lula que deve ser encaminhada é a idéia de colocar o povo no orçamento. Isto desencadear uma ampla campanha denúncia do atual Orçamento de forma a torná-lo absolutamente sem legitimidade junto à população. Há algumas medidas  simples de serem implementadas como o  restabelecimento do teto das remunerações pagas no setor estatal e fixá-lo como um múltiplo do  salario mínimo. Assim, para aumentar o teto teríamos que aumentar o salário mínimo. Outra Idéia Importante de Lula é o orçamento participativo. Hoje é muito simples de adotar o orçamento participativo, basta usar um aplicativo de celular como o gov.br para fazer as consultas das prioridades que a população deseja para as verbas públicas. O importante é alterar a atual política  orçamentária do Governo, já que o Orçamento atual é dividido entre o pagamento de Juros da dívida , das emendas parlamentares e a Previdência , incluindo as grandes pensões do Judiciário, Congresso e Executivo, nessa ordem. Mas dentro da pequena parcela  das chamadas despesas discricionárias, aquelas que o Governo pode como definir suas prioridades de gasto, poderia ser alocada ao menos uma parte destinada ao Orçamento Participativo. Esta pequena parte do Orçamento  não poderá, evidentemente, atender a todas as demandas populares de gasto do Governo, mas  será uma importante medida política e pedagógica. A população passará a entender com base numa experiência prática, os obstáculos que impedem o governo a não ter recursos para resolver seus problemas e como esses recursos são desviados para os bancos, através do pagamentos de juros da dívida interna. Isso possibilitará o desenvolvimento de uma luta da população contra esta imensa arbitrariedade que leva para uma minoria da sociedade os trilhões do Orçamento.

           Outro ponto importante anunciado pelo presidente Lula foi a volta das Conferências municipais e estaduais, mas principalmente a nova Conferencia Nacional de Política Públicas. É importante que se efetivamente leve a frente esta ideia, que poderá restaurar um pouco da política participativa que se criou a partir do 2º. Mandato de Lula.

           O  Governo Lula, no entanto só sobreviverá à oposição sistemática que lhe fará a direita e a extrema direita, se se basear na mobilização e organização popular de forma permanente. É preciso que se dê a maior amplitude possível esta mobilização, seja através da manutenção e ampliação dos Comitê de Luta, seja através de estruturas de mobilização nos Estados e Municípios em torno das propostas e programas do Governo. Só assim se poderá resistir à mobilizações contrárias e golpistas da extrema direita.

A questão do Meio Ambiente

                Sobre a questão do meio ambiente e da Amazonia é preciso resistir às tentativas de interferência externa, sob a capa de defesa da humanidade e princípios internacionais. A soberania na defesa da Amazonia e da eliminação das atrocidades bolsonaristas não pode ser confundida com uma internacionalização da Amazonia e do nosso meio ambiente. A política da defesa do meio ambiente não deve ser uma política anti desenvolvimentista e contra nossa soberania. Não há que pensar em suspender todos projetos de melhoria da vida das população brasileira em função de uma política submissa aos desígnios imperialistas. Não se deve abandonar o uso de hidrocarbonetos e  da energia nuclear, além de hidroelétricas para não confrontar o meio ambiente. A transição nessa área se fará de maneira gradativa e deve durar pelo menos 50 anos.. Só é possível atender as demandas da população pela promoção de um novo modelo econômico onde se explore todos os potenciais de nossos recursos em prol da maioria da população. Combinar o desenvolvimento com a defesa do meio ambiente não só é possível como necessário. O exemplo que temos é o da Alemanha , que desativou as sua usinas nucleares para fornecimento de energia e hoje sofre os rigores da politica imperialista que não lhe permite mais o consumo do gás barato russo.

A politica externa altiva e ativa

           A posição do Brasil perante a Guerra da Ucrânia deve ser de apoio crítico à Rússia no que ela fizer de política anti imperialista e buscar estabelecer a paz com uma derrota significativa do imperialismo, com a Rússia mantendo o domínio da região de Donbass e  a desmilitarização da Ucrânia, que não deverá se filiar à OTAN.

                O pilar básico de nossa política externa deve ser a construção de um mundo multipolar, onde o Brasil deve ocupar um lugar importante, colocando a politica externa como um instrumento de nosso desenvolvimento. Nesse sentido não deve haver submissão em nenhum aspecto à política do imperialismo  estadunidense, com o estabelecimentos relações econômicas políticas e culturais com todos os povos e nações, incluindo aí a China, a Rússia e demais países sancionados e bloqueados pelo imperialismo. Nosso governo deve ter total solidariedade aos povos oprimidos e espoliados pelas potencias imperialistas, com solidariedade aos países que forem penalizados pelo fato de adotarem um regime político ou modelos de desenvolvimento que sejam discriminados pelo imperialismo.