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Internacional

Rússia: o acordo do corredor de grãos e a cúpula Rússia -África

Por Ricardo Rabelo

O acordo de corredor de grãos firmado entre Rússia e Ucrânia para permitir a exportação de grãos pela Ucrânia para países pobres e Europa e a exportação dos grãos e fertilizantes russos para à África expirou em 17 de julho, e a Rússia decidiu não prorrogá-lo, pois foi implementado de forma a beneficiar apenas a Ucrânia.
Além disto, o exército ucraniano usou navios civis para transportar armas de um lado para o outro. Eles revendiam parte das armas recebidas dos países ocidentais para a África e o Oriente Médio, além de fazer ataques terroristas na ponte Kerch que liga a Rússia continental à Crimeia. Os grãos eram encaminhados não para os países pobres, mas para a Europa.
Quase metade das exportações de trigo e milho da Ucrânia para a União Europeia acabou indo para porcos na Espanha para fazer presuntos , segundo pesquisa do jornal austríaco eXXpress. O jornal estima que 2,9 milhões de toneladas de trigo e milho da Ucrânia foram parar na Espanha, onde foram usados como ração animal. Segundo o Express, apenas 15 por cento das exportações acabaram em países em risco de fome.
Por outro lado, os grãos e fertilizantes russos destinados à África foram bloqueados por embargos que afetam transporte, seguro e pagamentos por meio do sistema Swift, do qual retiraram o Banco Agrícola Russo . Embora tecnicamente não houve sanções a grãos o embargo ocidental proibiu todos os navios russos de atracar em portos ou acessar seguros e serviços de corretagem, impondo efetivamente um bloqueio completo à navegação comercial.
Embora a Rússia tenha manifestado a disposição de retomar o Acordo desde que suas condições sejam atendidas, a Ucrânia pretende criar um novo corredor marítimo que cortaria as águas territoriais da Romênia e a zona econômica marítima exclusiva na parte noroeste do Mar Negro. Uma nova rota marítima nas regiões noroeste e oeste do Mar Negro através da Romênia, Bulgária e Turquia (todos membros da OTAN) cortará a guarnição russa na Transnístria (Moldávia) e aumentará a capacidade de Kiev para atacar a Crimeia. O envolvimento da OTAN também complicaria qualquer futura operação russa para libertar Odessa, que é historicamente uma cidade russa. Além de seu enorme legado cultural e histórico, Odessa é um porto para produtos industriais russos e ucranianos. O oleoduto de amônia Togliatti-Odesa explodido pelos terroristas ucranianos há pouco tempo é um dos melhores exemplos. O oleoduto de 2.471 km, o mais longo do mundo para amônia, ligava o maior produtor mundial de amônia, TogliattiAzot, na região russa de Samara, ao porto de Odessa.
Em termos estratégicos, sem o controle sobre Odessa, a OTAN não pode ter projeção de força na região do Mar Negro ou esperar ressuscitar a Ucrânia como um posto avançado anti-russo. A OTAN também não pode avançar em direção à Transcaucásia e Cáspio (fronteira com o Irã) e à Ásia Central sem dominar a região do Mar Negro.
E pelas mesmas razões, a Rússia também não pode ceder a região do Mar Negro à OTAN. Odessa é uma conexão fundamental em qualquer ponte terrestre ao longo da costa do Mar Negro ligando o interior da Rússia com sua guarnição na Transnístria (Moldávia), que os EUA tentando tornar possível membro da OTAN. Na verdade, a segurança da Crimeia estará em risco se as forças hostis forem estabelecidas em Odessa.
Está claro que todo o projeto dos EUA na nova rota marítima visa impedir que a Rússia assuma o controle de Odessa. Do ponto de vista russo, isso se torna um problema real. A OTAN praticamente cercou a Marinha Russa no Mar do Norte e no Mar Báltico com a adição possível da Suécia e da Finlândia já concretizada. Isso coloca em risco a liberdade de navegação e o domínio da Frota russa do Báltico no Mar Negro, cruciais para que a Rússia possa acessar livremente o mercado mundial. E o Governo de Kiev já está implementando medidas para que essa nova rota se concretize o mais rapidamente possível.
A reação russa foi imediata: o ministério da defesa avisou que todos os navios que naveguem nas águas do Mar Negro para os portos ucranianos serão considerados potenciais transportadores de carga militar. Consequentemente, os países de tais embarcações serão considerados como participantes do conflito ucraniano ao lado do regime de Kiev.
Embora a realidade seja que o Ocidente não honrou reciprocamente sua parte do acordo para permitir a exportação de trigo e fertilizantes russos, como a ONU e a Turquia reconheceram, a propaganda ocidental caricatura a Rússia como criadora de escassez global de alimentos. E se a OTAN assume uma nova rota de grãos, essa narrativa pode prevalecer.

A Segunda Cúpula Rússia-África
A segunda cúpula Rússia-África será realizada nos dias 27 e 28 de julho em São Petersburgo juntamente com um fórum econômico. Um dos principais assuntos da cúpula será justamente a questão do embarque de fertilizantes e grãos russos para a África e a criação de corredores logísticos. A pressão do Ocidente junto aos países participantes também está dificultando a viagem de muitos líderes africanos à Rússia para participar dos eventos.
Os países da África tem mostrado uma grande capacidade de resistir às pressões. Até agora, de acordo com os organizadores, 49 líderes africanos confirmaram presença, o que representa metade do continente. Fontes ocidentais divulgam outros números, mas o certo é que a maioria dos países evita sistematicamente tentativas de envolvê-los em planos anti-russos, mas também não é possível dizer que todos são pró-Rússia.
Para além do ambiente político, existe uma agenda prática para a vasta comunidade africana, centrada no desenvolvimento económico, segurança alimentar, investimento, educação, reforço das instituições públicas etc.
A importância do evento para Rússia está mostrada pelo fato de Putin ter convidado a ex-presidenta brasileira Dilma Rousseff (PT) para uma reunião na véspera do início da Cúpula no Kremlin. Ela faz a visita na condição de chefe do Banco dos Brics, o bloco que une Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul. Mas Dilma sempre foi tratada muito bem pelos russos nos seus mandatos. Ela esteve como presidente no país em três ocasiões, em 2012, 2013 e 2014, na última oportunidade em uma cúpula do Brics. Quando sofreu impeachment, em 2016, a imprensa estatal russa usava frequentemente a palavra golpe para definir o processo.
Além de Dilma, Putin pretende realizar uma série de reuniões bilaterais ao longo da Cúpula. De acordo com Oleg Ozerov, embaixador geral do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, não serão discutidos apenas fertilizantes e grãos, mas também quaisquer outros produtos fabricados na Rússia. Ozerov observou que a criação de corredores logísticos terá um impacto positivo nas futuras relações com os países africanos. O Ministério das Relações Exteriores da Rússia garantiu que Moscou fará todo o possível para que os estados africanos não sintam a paralisação do negócio de grãos.

28/07/2023

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