Infoecosys: contra o neoliberalismo, o fascismo e imperialismo. A favor dos trabalhadores: um novo Brasil é possível !

Internacional

A luta do Iêmen contra o imperialismo

Por Ricardo Rabelo

O Iêmen é um dos países mais pobres do Oriente Médio e Norte da África resultante  da união de dois  países: o Iêmen do Sul e o Iêmen do Norte. Esses dois países se separaram em 1990, após a unificação do país sob um regime republicano multipartidário. O Iêmen do Sul é uma república presidencialista que faz fronteira com a Arábia Saudita e tem como capital a cidade de Aden. O Iêmen do Norte é uma república socialista que faz fronteira com a Síria e tem como capital a cidade de Sanaa. As principais atividades econômicas do Iêmen são a produção e refino de petróleo, a agricultura, a indústria e os serviços. O petróleo representa cerca de 90% das receitas fiscais do país e é exportado principalmente para a Arábia Saudita, China e Índia. O valor do PIB do Iêmen foi estimado em US$21.045 milhões em 2023. O PIB cresceu -0.5% em 2023 .O PIB per capita foi estimado em US $618 em 2023.

A distribuição de renda no Iêmen é muito desigual. Segundo o Banco Mundial, os 10% mais ricos da população detêm cerca de 60% da renda total, enquanto os 40% mais pobres detêm apenas cerca de 2%. A pobreza atinge cerca de 48.6% da população. A inflação foi estimada em 14.9% em 2023 (em termos anuais).

O conflito entre os dois países começou em 2014, quando os rebeldes hutis, um grupo xiita que controla grande parte do norte do país, tomaram o poder em Aden e expulsaram o presidente Abd-Rabbu Mansour Hadi, que era apoiado pela Arábia Saudita e seus aliados ocidentais. Hadi assumiu o cargo após um golpe militar que derrubou o presidente Ali Abdullah Saleh em 2011. O conflito com a Arábia Saudita e uma coalizão de países arábes formada por   Omã, Bahrein, Sudão, Emirados Árabes Unidos, Qatar, Kuwait, Egito e Marrocos se baseou nestas disputas territoriais e ideológicas. A Arábia Saudita fez uma série de ataques aéreos contra os Houtis com o objetivo declarado de restaurar o governo liderado por Abdrabbuh Mansur Hadi.

O papel dos Estados Unidos neste conflito foi de apoio militar e diplomático à coalizão liderada pela Arábia Saudita. Os Estados Unidos forneceram armas, inteligência e treinamento aos países membros da coalizão, além de pressionar outros países a se juntarem ao esforço de guerra. Foi mais uma guerra estimulada pelo imperialismo norte americano no mundo. Para justificar uma guerra de agressão ao Iêmen, os Estados Unidos acusaram o Irã de apoiar os hutis e de ameaçar a segurança regional através da expansão territorial no norte do Iêmen.

Os Houtis são um grupo religioso que se originou no século IX como uma ramificação da seita xiita Zaydiyyah. Eles se consideram os defensores da verdadeira fé islâmica contra os governantes corruptos. Eles também têm uma forte identidade nacionalista que lhes permite resistir à dominação estrangeira.

O conflito no Iêmen causou uma grave crise humanitária, com milhões de pessoas sofrendo de fome, doenças, violência e deslocamento forçado. A ONU estima que cerca de 20 milhões de pessoas precisam de ajuda humanitária urgente no país A guerra também teve consequências econômicas devastadoras para o país e para a região.

A solidariedade do Iêmen com a Palestina

Ao contrário da maioria dos países árabes, cujas burguesias e  “nobrezas”   criminosas  nada fizeram para tentar impedir a continuidade do genocídio em  Gaza, o Iêmen, liderado pelos Houtis, começaram a agir imediatamente após o início do massacre. O objetivo é claro: fazer um cerco aos navios que levam mercadorias para Israel e passam pelo estreito de Bab al-Mandab , controlado pelo país, para obrigar Israel a suspender  a “guerra” contra os palestinos.

É difícil saber ao certo quantos navios foram atingidos pelo Iêmen, porque a imprensa tenta impedir a divulgação, mas é um número significativo. Um levantamento na imprensa nacional e internacional aponta para os seguintes casos:

 No dia 18 de outubro, dois navios comerciais foram atacados no Mar Vermelho por drones controlados pelos Houthis. Os navios eram o MSC ALANYA e o MSC AL JASRAH, ambos operados pela companhia marítima alemã Hapag Lloyd. Os ataques causaram danos aos navios e obrigaram as empresas a mudar suas rotas e evitar a região.

No dia 19 de outubro, um navio mercante chamado Galaxy Leader foi sequestrado pelos Houthis e desviado para um porto iemenita. O navio tem bandeira das Bahamas e é de propriedade parcial de um empresário israelense. A tripulação do navio foi levada como refém pelos rebeldes.

No dia 18 de novembro, dois navios comerciais foram atacados no Mar Vermelho por drones controlados pelos Houthis. Os navios eram o MSC ALANYA e o MSC AL JASRAH, ambos operados pela companhia marítima alemã Hapag Lloyd. Os ataques causaram danos aos navios e obrigaram as empresas a mudar suas rotas e evitar a região.

No dia 20 de novembro, um navio cargueiro que fazia a rota Turquia-Índia foi sequestrado pelos rebeldes Houthis e todos os tripulantes.

Em 14 de dezembro, o governo iemenita anunciou que realizou um ataque com drones contra o navio Maersk Gibraltar, com destino a Israel. Dias antes, as forças navais iemenitas lançaram um míssil contra um navio norueguês que transportava petróleo e tinha como destino o porto israelense de Ashdod.

Em comunicado oficial, as Forças Armadas afirmaram , que em 15 de dezembro  “ realizou uma operação militar contra dois navios porta-contêineres (MSC Alanya e MSC Palatium III), que se dirigiam para a entidade israelense, atacando-os com dois mísseis navais”. O ataque ocorreu depois que “as tripulações se recusaram a responder aos chamados das forças navais iemenitas, bem como a mensagens de alerta inflamadas”.

No mesmo dia a companhia de navegação alemã Hapag-Lloyd anunciou que um de seus petroleiros, o navio Al-Jasra, de bandeira liberiana, foi atingido por um projétil no estreito de Bab al-Mandab. As forças armadas iemenitas e o movimento de resistência Ansarallah prometeram que qualquer navio que se dirigisse a Israel seria tratado como um alvo militar legítimo. Neste mesmo dia a Casa Branca enviou mensagens a Ansarallah alertando-os para parar suas ações contra navios com destino a Israel no Mar Vermelho.

Uma ação exemplar contra o Imperialismo e Israel

Duas das maiores companhias de navegação do mundo interromperam temporariamente todas as operações no Mar Vermelho, enquanto o Iêmen mantém suas ações contra  navios comerciais com destino a Israel.A gigante dinamarquesa de transporte marítimo Maersk e a alemã Hapag-Lloyd AG anunciaram em 15 de dezembro uma pausa temporária em suas operações no Mar Vermelho após uma série de ataques a navios com destino a Israel no estreito de Bab al-Mandab pelas forças armadas iemenitas.

Pouco depois, a Hapag-Lloyd – que controla cerca de sete por cento da frota global de navios porta-contêineres – anunciou que iria “pausar todo o tráfego de navios porta-contêineres pelo Mar Vermelho.”

A decisão disparou alarmes em Israel, já que analistas estimam que o país dependente de importações verá atrasos significativos na chegada de mercadorias, bem como um aumento nos preços que variam entre cinco e 10% para produtos elétricos, veículos e matérias-primas, de acordo com o jornal  Israel Hayom.

Os contínuos ataques do Iêmen a navios ligados a Israel representam um novo desafio para a economia israelense, que já estava abalada após mais de dois meses do genocídio  contra os palestinos.De acordo com estimativas divulgadas pelo Tesouro do país no início deste mês, a economia deve encolher pelo menos 15% ao ano no quarto trimestre.

Mais duas grandes empresas de navegação anunciaram a suspensão da passagem pelo Mar Vermelho em 16 de dezembro, elevando o número total de companhias para quatro.  A Mediterranean Shipping Company (MSC) e a CMA CGM – empresas ítalo-suíças e francesas – anunciaram sua decisão um dia depois que dois navios com destino a Israel foram atacados pelas Forças Armadas iemenitas em 15 de dezembro.

O grande impacto na economia mundial da ação do Iêmen

Os houthis conseguiram fazer o que Israel e Estados Unidos tentaram evitar a todo o custo até agora: transformar o genocídio em Gaza numa crise mundial. Atingiram o calcanhar de Aquiles do inimigo: a economia, ao bloquear o trânsito pelo Mar Vermelho de qualquer embarcação israelense ou com destino a Israel.

Pelo lado de Israel, os prejuízos à sua economia já contam bilhões de dólares. O jornalista libanês Khalil Harb destacou, em artigo no jornal “The Cradle”, que Israel importa e exporta “quase 99% das mercadorias por via fluvial e marítima” e que mais de um terço do seu PIB depende do comércio de mercadorias, segundo o Banco Mundial. Esse é um duro golpe e compromete diretamente a continuidade da matança desenvolvida pelas forças sionistas em Gaza, que já custaram a vida de 20 mil pessoas.

Mas a ação houthi não é espetacular somente porque atinge a coluna vertebral da máquina genocida de Israel, e sim, sobretudo, porque está paralisando a economia mundial – isto é, o próprio funcionamento do regime capitalista, que está na raiz do problema da guerra de agressão no Oriente Médio. E quem admite isso é nada menos que o principal órgão de imprensa dos banqueiros internacionais, The Economist: “uma nova crise de Suez ameaça a economia mundial.”

Um artigo em tom preocupante destaca que o bloqueio naval imposto pelos houthis têm o potencial tanto de escalar a guerra e expandi-la para o restante da região como também prejudicar radicalmente o comércio global. A principal alternativa para Israel e Estados Unidos seria atacar militarmente o território do Iêmen que é governado pelos houthis, mas estes poderiam retaliar não apenas com ataques a Israel, como também aos aliados árabes de Washington, como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Jordânia, principalmente contra campos petrolíferos, o que elevaria brutalmente a crise econômica com uma nova crise do petróleo (que já se iniciou).

O Império contra ataca

O imperialismo norte-americano , após três meses de ataques dos Houthis, resolveu reagir. Em 20 de Dezembro os Estados Unidos anunciaram o lançamento de uma força multinacional para confrontar as ações de embargo dos houthis  de navios  que comerciam com Israel.

O Secretário de Defesa americano, Lloyd Austin, informou que Canadá, França, Itália, Seicheles e Reino Unido estão entre os dez países a compor a iniciativa, além de Bahrein – único Estado regional  a trair seus países irmãos até então unidos.

As tropas iemenitas confirmaram lançar disparos contra as embarcações Swan Atlantic e MSC Clara — de bandeira norueguesa e panamenha, respectivamente —, após ambas as tripulações ignorarem seus alertas

A Arábia Saudita estava muito perto de assinar um acordo com os houthis do Iêmen em função da normalização de relações entre o país e Irã, mediada por Pequim. Os Eua estão totalmente empenhados em romper esta aliança , com Blinken  e Austin envolvidos em articulações com a Arábia Saudita, Bahrein e Catar.

Ao menos 12 empresas de navegação, incluindo a gigante ítalo-suíça Mediterranean Shipping Company (MSC), a francesa CMA CGM e a dinamarquesa AP Moller-Maersk suspenderam o tráfego no Mar Vermelho por razões de segurança.A corporação British Petroleum (BP) juntou-se à medida nesta semana. A Grécia também aconselhou que embarcações comerciais evitem a região, já que firmas ligadas ao país controlam 20% das embarcações comerciais do mundo em termos de capacidade de carga.

As ações houthis têm impacto direto e efetivo, com ameaças inflacionárias. Cerca de 12% do comércio global e 30% do tráfego de contêineres passa pelo Mar Vermelho, que se conecta ao Mar Mediterrâneo via Canal de Suez.

O ministro da Defesa do Irã, Mohammed Reza Ashtiani, disse à mídia iraniana em comentários publicados em 14 de dezembro que a força-tarefa marítima proposta por Washington e seus aliados do Golfo que estão procurando formar para proteger a navegação israelense enfrentaria “problemas extraordinários”.

“Se fizerem um movimento tão irracional, enfrentarão problemas extraordinários. Ninguém pode fazer um movimento em uma região onde temos predominância”, disse Ashtiani à imprensa.Não há maneira de evitar a escalada a não ser avançando para um cessar-fogo permanente na Faixa de Gaza”, disse Abdel Malik al-Ajri, membro do bureau político de Ansarallah.

“Mesmo que todas as frotas navais da Terra se reunissem no Mar Vermelho, elas não trariam segurança a Israel ou navios israelenses, nem navios indo para [Israel]” completou Abdel.

Além da ação iemenita à navegação israelense, as forças navais do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC) são conhecidas por terem uma presença proeminente no Mar Vermelho. “Todos os países estão presentes na região, mas esta região é nossa e nós a dominamos”, disse Ashtiani à mídia iraniana.

A Resistencia Palestina continua forte

O movimento Ansarallah afirmou que continuará a usar meios militares para impedir que todos os navios façam negócios com Israel até que: 1. Israel termine seu ataque genocida contra os palestinos; e 2º. toda a ajuda humanitária é autorizada a entrar em Gaza para fornecer alimentos, água potável e outras necessidades para a população sitiada lá.

De acordo com o estudo EuroMedHR sobre a crescente crise de fome em Gaza: 71% das pessoas sofrem de fome severa, com 98% incapazes de consumir alimentos suficientes, 64% comendo frutas, alimentos selvagens ou crus e itens vencidos.

Em vez de organizar uma frota para levar ajuda humanitária vital a Gaza, esta operação imperialista liderada pelos EUA pretende claramente representar uma ameaça militar para o Iémen e outros países soberanos da região, como o Irã.

Resistência continua forte

O povo do Iémen, que saiu às ruas aos milhões em solidariedade com a Palestina, e os seus líderes tem mantido sua ação.  O ministro da Defesa iemenita, major-general Mohammad al-Atifi, declarou à coalizão imperialista: “Temos o que afundará suas frotas, seus navios de guerra, seus submarinos e seus porta-aviões, e o Mar Vermelho será seu cemitério.”

“Os Estados Unidos recentemente tentaram uma comunicação direta com a República do Iêmen em Sanaa, mas ela foi rejeitada. Orgulhamo-nos de recusar a comunicação direta com um país que mata crianças no Iémen e em Gaza. A América é o verdadeiro terrorismo”, disse outra autoridade iemenita.

Em um comunicado, a Frente Popular para a Libertação da Palestina declarou: “O verdadeiro objetivo de formar esta coalizão é proteger o Estado da entidade [Israel] e salvá-lo de sua situação devido à lendária firmeza de nosso povo e sua resistência, e aos ataques qualitativos realizados pelas forças armadas iemenitas contra alvos sionistas no sul da Palestina ocupada e nas águas do Mar Vermelho.”

“Isso também confirma sua determinação [da coalizão] de aumentar sua presença e capacidade na região e controlar seus recursos e riquezas, representando um desafio e uma ameaça à segurança da região e à paz e segurança internacionais.”

“Esta chamada operação Prosperity Guardian representa uma ameaça não apenas ao direito do Iêmen à autodefesa, mas para toda a região, e especialmente para o Irã, que o imperialismo ocidental considera a principal oposição estatal soberana.”

“Assim como o movimento mundial de solidariedade à Palestina protestou veementemente contra o terrível genocídio em Gaza, esse mesmo movimento não pode permanecer calado diante da ameaça  de uma guerra regional crescente impulsionada por forças pró-sionistas lideradas pelo imperialismo norte-americano.”

Leave a Reply