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Internacional

Nações Unidas: uma instituição nefasta

Por Ricardo Rabelo

              Quando se relembra a partilha da Palestina hpela ONU em 1948, e a operação de expulsão do povo palestino de seu território milenar, tudo aparece como se a “Nakba” fosse  um exercício malévolo dos sionistas do direito à terra pelo “povo sem terra” . Na verdade, a ONU serviu como arcabouço legal para toda violência e brutalidade levada a cabo pelos sionistas. Tudo encoberto pela “criação de dois Estados” com só uma “pequena vantagem” para os judeus, afinal eles haviam sofrido o “holocausto”. Os palestinos eram a maioria no seu território, que foi roubado pelos judeus, que ficaram com mais da metade e as melhores terras da região. Na partilha, em relação ao território, 53% seriam atribuídos aos 700 mil judeus, e 47% aos 1 milhão e 400 mil árabes.

 Em 4 de abril de 1949 foi criada a  OTAN, contrapartida da ONU, uma instituição vocacionada para a paz, enquanto a outra se voltava para a guerra. Afinal, “se queres a paz prepara-te para a guerra” era o lema que se repetia na época. Também por pura coincidência , foi nessa época que o grande Winston Churchill fazia  seu grande discurso que lançava a idéia da “cortina de ferro” e dava início à “guerra fria”.  Uma batismo de fogo, que autorizava as instituições ocidentais à rapina dos recursos dos povos do “3º. mundo” e ao extermínio das populações colonizadas ou neo-colonizadas se ousassem reagir contra a nova ordem mundial. Para isso foi criada a  CIA , para fazer o trabalho secreto e sujo, coordenado pelos EUA e a OTAN. Esta última age como uma espécie de alto comando do imperialismo cuja estratégia será sempre a guerra, ou seja “ a política por outros meios” , que é também “business” para fortalecer o capital financeiro e o complexo militar-industrial.

O que Rússia, Cuba, Irã, Coreia do Norte , Síria e Palestina têm em comum? Em princípio, nada pois possuem sistema político, e econômico, que são completamente diferentes e até antagônicos entre si. No entanto, todos eles têm em comum o fato terem sofrido as consequências das medidas coercitivas unilaterais impostas pelos EUA e pelos seus parceiros, que afetaram não só o desenvolvimento da sua economia nacional, mas também colocaram em risco sua própria sobrevivência como países.

A ONU contra o Iêmen, a favor do genocídio em Gaza

No contexto do genocídio em Gaza , a  lógica de iniciar uma operação militar, como “guardiões da prosperidade”  contra o Iêmen, por ser uma “afronta” ao livre mercado e ao desenvolvimento do comércio internacional, tenta esconder a defesa direta feita  pelo imperialismo do mais cruel e atroz extermínio de um povo. O mais irônico é que quem escolheu o caminho da asfixia financeira e comercial de países, através de sanções ou bloqueios contra nações inteiras, para fins políticos e militares foi o próprio imperialismo. Nesse caso não se importaram se elas também significassem “afrontas ao livre mercado e ao comércio internacional”.

Portanto, usar o bloqueio econômico para fins políticos não é algo que o Iêmen inventou, mas  é exatamente o que as sanções ocidentais contra vários países do mundo buscam. Porque o objetivo das sanções é forçar a “solidariedade internacional” em favor dos interesses dos EUA e comparsas  que os países sancionados perturbam ao implementarem políticas autônomas para seu desenvolvimento nacional.

Nesse sentido iemenitas tem todo o direito de forçarem os países à solidariedade com o povo palestino, motivo suficiente para que utilizem o bloqueio dos navios que se dirigem à Israel e por essa razão causem perturbações nos mercados e nas transações internacionais. E como essa ação militar dos EUA e Reino Unido de agressão militar ao Iêmen se tornou possível?  Exatamente pela cobertura legal  das Nações Unidas, com a  aprovação de uma  resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas condenando as ações do Iêmen contra navios ligados a Israel no Mar Vermelho .

Esta não é a primeira vez que a livre interpretação de uma resolução do Conselho de Segurança leva ao início de um ataque ocidental internacional a outro país. Lembre-se, por exemplo, do que aconteceu em 2011 na Líbia. O país, um dos mais desenvolvidos da África, foi covardemente bombardeado  durante o tempo necessário para destruir toda sua infraestrutura econômica e instituições governamentais. Hoje o país está completamente destroçado, com o “ocidente’ apoiando um dos governos que lá existem.

No caso da Líbia, a Resolução 1973 do Conselho de Segurança das Nações Unidas autorizou a adoção de “todas as medidas necessárias […] proteger civis e áreas povoadas por civis sob ameaça de ataque”. Dessa vez, a França interpretou que tinha permissão para lançar um ataque militar ao país, com o apoio da OTAN.

Embora a resolução, tivesse previsto a proibição de todos os voos no espaço aéreo líbio “para ajudar a proteger os civis”, ela não foi respeitada. Até Outubro de 2011, a coligação liderada pelos franceses foi responsável pela morte de 30 mil pessoas devido às consequências dos seus bombardeios.

A França, usando a famosa “responsabilidade de proteger”, tinha como objetivo real promover a  mudança de regime no país, já que o governo progressista de Muammar Kadafi havia se tornado uma pedra no sapato de seus planos de manter o controle sobre o continente africano. As consequências  desta operação foram o aumento do tráfico de armas e de seres humanos, bem como uma crise migratória sem precedentes. Além disso, a situação levou à chegada maciça de grupos fundamentalistas Takfiri, que desempenharam um papel proeminente na desestabilização da região do Sahel, o que serviu à França para justificar novas operações de intervenção noutros países, como o Níger ou o Mali. Não é à toa que, recentemente, as novas autoridades que assumiram o poder nos países do Sahel insistiram na expulsão das tropas francesas.

O Imperialismo no Oriente Médio

O papel dos EUA no Oriente Médio, de tentar mudar os regimes que afetam seus interesses particulares, tem resultado em uma total rejeição deste  país  pelos governos,  movimentos políticos, e principalmente pelos palestinos. As duas guerras do Golfo – incluindo a invasão do Iraque em 2003 – o papel dos EUA no conflito armado na Síria onde se apoiou em grupos terroristas como o ISIS , o seu papel no apoio a Israel e, portanto, a sua manifesta corresponsabilidade no genocídio contra o povo palestiniano só vem acentuar a consciência  de que os EUA e comparsas são seus inimigos. No mesmo sentido agiram as suas manobras para forçar confrontos entre países vizinhos, como a guerra imposta entre o Iraque e o Irã, que ainda tem grandes sequelas em ambos os países, ou a tentativa de usar sua aliança com a Arábia Saudita em seus planos de colocar Teerã ou Iêmen de joelhos, são apenas alguns, entre muitos outros eventos dessa natureza.

Enquanto as alianças regionais, como o Eixo de Resistência, se unem sob a premissa de expulsar definitivamente essas forças desestabilizadoras da região e, portanto, como conglomerado pela paz e pela defesa da soberania dos povos, as alianças propostas pelo imperialismo  se baseiam repetidamente no enfrentamento à soberania de nações e mesmo de regiões inteiras para garantir uma hegemonia sustentada pela dominação,  a dependência e a anulação dos direitos soberanos das nações.

              Neste contexto  fica claro o verdadeiro papel das Nações Unidas que se respalda em ser um  fórum multilateral onde a maior parte do planeta está representada, mas que favorece sempre a justificativa “legal” para perpetuar o poder de “veto” dos EUA  contra o clamor mundial pelo cessar fogo permanente em Gaza.

Há mais de setenta resoluções das Nações Unidas que denunciaram e corroboraram o apartheid e a ocupação sofridos pelo povo palestino, declararam ilegais os assentamentos de colonos de Israel e a construção de muros de vergonha. Nada disto impede, por exemplo,  que a União Européia   decidisse impor sanções contra o líder do Hamas pelas ações realizadas em 7 de outubro de 2023.

A importância da ação dos Houtis

A Batalha do Mar Vermelho é uma competição estratégica de grande importância. Tem um grande repercussão na navegação marítima e no transporte internacional. Cerca de cinquenta navios navegam pelo estreito de Bab El-Mandeb todos os dias, transportando cinco milhões de barris de petróleo e 700 bilhões de barris de mercadorias, a maioria deles com destino aos mercados europeus. Mais de 20.000 navios por ano cruzam uma passagem que encurta a distância entre Mumbai e Gênova em 58%. Essa situação oculta um outro conflito ainda mais radical , aquele que se dá entre as rotas comerciais terrestres e marítimas que a China e os EUA disputam acirradamente.

Nos últimos dez anos, a China vem construindo a Nova Rota da Seda  e  um cinturão econômico e marítimo da Europa ao Leste Asiático. Para isto a China e os países participantes já investiram bilhões de dólares na renovação de portos e ferrovias e na construção de  56 novas zonas comerciais em cerca de vinte países. Só o volume de negócios entre Pequim e Riad atingiu 116 bilhões de dólares. Diante desses enormes projetos, os EUA partiram para apresentar uma alternativa global na cúpula do G20 realizada em julho passado em Nova Delhi. Trata-se  da criação da “passagem econômica entre Índia e Europa” com fundamental participação de Arábia Saudita, Emirados e Israel. Esse projeto norte-americano  só poderá ser concretizado se houver a  normalização das relações entre Tel Aviv e Riad, cujas negociações foram paralisadas com o genocídio em Gaza.  Pelo lado de Israel surgiu também o projeto do Canal Ben Gurion, apresentado por Netanyahu a Biden na última cúpula em Sharm El-Sheikh, e cuja efetivação só pode se dar pela limpeza étnica total da Palestina.

A ação do Iêmen  não apenas prejudicou totalmente os projetos  dos EUA na área, mas trouxe um novo complicador para manter a operação normal da rota marítima que é vital para o Ocidente. Recentemente o New York Times divulgou os debates que têm surgido no interior  das forças armadas norte-americanas sobre como reestruturar  a força de dissuasão do país em função do desafio imposto pelo Iémen. A militarização do Mar Vermelho, pode ter o efeito contrário ao desejado ao aumentar o risco de navegação na região.

O Canal Ben Gurion, é um projeto antigo de Israel de ligar  o Mar Mediterrâneo com Akaba, ao sul da Faixa de Gaza, no Mar Vermelho, que teria o dobro da capacidade de tráfego de Suez e que possibilitaria  a execução de projetos turísticos na região. O único “problema” é que no meio desse caminho há um grande obstáculo: a necessidade e realizar uma nova e enorme Nakba com a expulsão de dois milhões e meio de palestinos  e seu refúgio no Sinai.

O maior problema é a forte oposição do Egito porque isso resultaria em perder o controle do transporte marítimo que detém atualmente, bem como seu status de ponte turística para a Arábia Saudita. Os sauditas desejam construir Neom , uma megalópole  de 26.000 quilômetros quadrados às margens do Mar Vermelho,  sonho de  Mohammad Ben Salman Para isso precisa normalizar as relações diplomáticas com Tel Aviv, aderindo aos Acordos de Abraão impedidos pelo massacre de Gaza.

Nesse sentido o genocídio em Gaza é a realização de projetos não só de Israel, mas de muitos interesses do imperialismo mundial suas ramificações no Oriente Médio. A luta contra o Genocídio em Gaza, portanto envolve não só os que combatem os planos sionistas de Israel, mas também todos que se batem contra o capitalismo predatório cada vez mais agressivo, à ditadura dos mercados, às instituições financeiras e contra todos aqueles que procuram minar as conquistas sociais que a classe trabalhadora alcançou durante séculos de luta.

O significado da Luta do Hamas em Gaza

Os eventos de  7 de outubro revelaram, portanto,  que a derrota do quinto exército do mundo porá fim ao seu papel de cabeça de ponte imperialista e impedirá que imponha suas decisões pela força. Não há dúvida atualmente que o  imperialismo norte-americano é claramente cumplice nos crimes em Gaza,   porque está diretamente envolvido nas operações e já   forneceu apoio financeiro  a Israel de,  no mínimo, US$ 14 bilhões.  Além disso, o 7 de Outubro significou o fim ou a desaceleração do processo de normalização das relações entre as monarquias petrolíferas e Israel. Regimes como o saudita ou o bareinivista, retrógrados e despóticos, temem uma vitória do Hamas e continuam a encorajar os EUA a fazer a ponte com Israel.

Desde sua derrota em 2006, Israel parou de se aventurar em território libanês para não sofrer uma nova derrota. O dia 7 de outubro marcou o fim do mito da invencibilidade de seu exército. A vulnerabilidade de sua segurança foi tão ultrajante que ele surpreendeu seus amigos mais do que seus inimigos. Isso explica o envio imediato de frotas ocidentais para a área prontas para defendê-lo irrestritamente.

O sofisticado exército sionista está completamente preso em um território não maior do que 365 quilômetros quadrados como Gaza, após três meses de intensos bombardeios, matou  mais de 25 mil civis,  e não alcançou nenhum dos três objetivos que anunciou – deter o Hamas, libertar os reféns e empurrar os palestinos para o êxodo . —-

A situação de Israel é problemática  e o  próprio Estado-Maior israelense,  culpa Netanyahu pela derrota, e também pelo ex-chefe do Mossad, Yossi Cohen, que em 4 de janeiro enviou uma carta aberta ao governo pedindo o fim das hostilidades afirmando que  o que está em jogo agora é a existência de Israel. O diretor do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, John Kirby, também destacou que, após 100 dias de guerra implacável, o Hamas mantém sua força impressionante e apoio inegável entre os palestinos. Outro argumento revelador é que, após três meses de combates, Israel ainda luta contra os comandos do Hamas no norte de Gaza, uma área que foi completamente arrasada.

Israel insiste em  em lançar bombardeios contra civis, mas é incapaz de lutar no terreno, de acordo com a maioria dos especialistas. Foi derrotado no Líbano em 2000 e 2006. A imprensa israelense começa a falar em grandes perdas de vidas e no colapso do moral de suas tropas. Algumas fontes indicam que 2.500 soldados desertaram e que 1,5 milhão de israelenses deixaram o país desde 7 de outubro. Recentemente pelo menos a metade de um batalhão de novos recrutas incorporados  se negou a lutar em Gaza.

O  Hamas é um movimento palestino ancorado nas camadas populares de Gaza, na Cisjordânia e nos campos palestinos no Líbano, Síria e Jordânia. Ele foi eleito democraticamente em 2007 em eleições supervisionadas pelas Nações Unidas e, desde sua vitória, a Faixa de Gaza está sob um bloqueio colonial. Não é sua adesão ao Islã que incomoda, mas a sua recusa em depor as armas sem a libertação prévia da Palestina e a sua rejeição dos chamados tratados de paz, como Camp David ou Oslo, que apenas provocaram a perda de território  para os palestinos. Sua estrutura nada tem a ver com as de organizações mercenárias supostamente islâmicas, como Daesh, Al-Qaeda, Al-Nussra e Junud al-Sham, criadas pela CIA para semear problemas no mundo árabe e minar o que resta das instituições estatais por meio da expansão da “guerra civil permanente”.

O Hamas é um movimento de libertação nacional  que surgiu do povo palestino sitiado e cuja popularidade não está na aplicação da doutrina islâmica, mas em sua resistência à capitulação buscada pelas potências coloniais. Seus apelos transcendem fronteiras e apelam aos homens livres do mundo, à classe trabalhadora e aos sindicatos cuja mobilização se tornou “a única esperança para deter essa barbárie”. Isso é completamente novo. E a formidável  mobilização de solidariedade internacional que ocorreu mostra o gigantesco isolamento internacional dos sionistas e do Estado de israel. Internamente é grande a mobilização popular contra o governo  atual e a oposição só assumirá o governo se acabar o massacre em Gaza.

Apesar da terrível repressão na Cisjordânia, onde 360 pessoas foram mortas e 1.200 presas desde 7 de outubro, vários comitês de apoio do Hamas foram formados em Jenin, Nablus, Haifa e Jaffa. O Hamas esteve no centro de todas as intifadas e mobilizações na Cisjordânia, incluindo as prisionais, e muitos de seus líderes atuais nasceram lá. Eles lideraram a batalha pelo bairro de Sheikh Jarrah, em Jerusalém, e organizaram manifestações por dois anos ao longo da linha de demarcação para impedir os assentamentos. Finalmente, deve-se notar que seu líder, Yehya Al-Sinwar, afirma em seus discursos a continuidade da linha de emancipação fundada por Arafat, o que abre as portas para reunir muitos ativistas do Fatah, insatisfeitos com a traição da Autoridade Palestina, cujo governo não tem mais poder real.

Tudo indica que é possível uma vitória do Hamas e que isso significaria o fim do Estado de Israel, da forma que é organizado hoje. O imperialismo vai tentar impedir que se forme um Estado plurinacional, mas sua capacidade de ação em tempos de paz se limita às operações de mudança de regime, que tem sido todas derrotadas nos últimos tempos. A grande questão que se coloca é: a ONU sobreviverá nesta nova configuração mundial que se anuncia ou será enterrada junto com os destroços gerados pelo imperialismo em Gaza e no mundo todo?

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