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Internacional

A fome como estratégia de guerra

Por Ricardo Rabelo

                A reunião do Congresso estadunidense para ouvir o discurso  do “Estado da União”  por Biden  parecia uma reunião  do Soviete Supremo stalinista de outros tempos.  De repente, sem nenhuma razão aparente, todos ficam de pé e ovacionam o demente Genocide Joe sem nenhuma manifestação contrária aos absurdos que são ditos. Uma completa e patética unanimidade de apoio ao candidato democrata que muito provavelmente será derrotado por Trump nas eleições presidenciais de novembro.

                Apesar da catástrofe que se anuncia para o governo Biden, a continuidade da política dos EUA com relação ao genocídio em Gaza é mantida com alguns floreados sem muito sentido lógico. Alguns dias antes, em fevereiro, o governo Biden, vetou mais uma vez um projeto de resolução exigindo um cessar-fogo imediato e permanente no Conselho de Segurança da ONU.  A questão é que os EUA e Israel querem uma mudança de regime em Gaza e colocaram seus serviços “secretos” para “negociar” com o Hamas, que só pode aceitar uma “pausa temporária” do genocídio para a liberação dos “reféns” de Israel . O Hamas, muito acertadamente, só aceita   um cessar-fogo permanente, com a desocupação de Israel dos territórios palestinos  e o apoio à proposta de um Estado palestino com sede em Jerusalém. Como negociar com o imperialismo e o Estado fascista sionista, se no último acordo Israel liberou alguns prisioneiros políticos, mas fez depois um encarceramento em massa de palestinos que aumentou enormemente o número total de “prisioneiros”?

A política de obter a liquidação total do Hamas, que é a potência governante em Gaza, significa a manutenção do genocídio em Gaza por  Israel e torna a administração Biden cúmplice do uso da fome como arma de guerra e da ajuda humanitária como moeda de troca. E explicita também que a política do imperialismo é a mesma de Israel, ou seja, a expulsão em massa de palestinos de Gaza, pois suas  ações estão preparando as bases para  a “limpeza étnica”.

Os objetivos estratégicos do Imperialismo em Gaza

O porta-voz de segurança nacional da Casa Branca, John Kirby, disse à imprensa que o objetivo de uma pausa de seis semanas é levar ajuda humanitária a Gaza e retirar os reféns restantes detidos pelo Hamas e outros grupos. É uma admissão explicita que após essa pausa e com o Hamas sem o poder de barganha dos reféns, um banho de sangue será perpetrado por Israel, para obrigar a saída dos palestinos de Gaza para o deserto de  Sinai ou para o mar. Kirby disse ainda que “não apoiamos um cessar-fogo geral que deixaria o Hamas no comando”.

A destruição provocada por Israel e as ordens de evacuação forçada deslocaram a maior parte da população de Gaza, de 2,3 milhões de palestinos, para o sul de Gaza. Cerca de 1,5 milhão de pessoas estão agora concentradas em Rafah, ao longo da fronteira de Gaza com o Egito. Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel, diz que os militares invadirão Rafah independentemente de qualquer pausa temporária.

Os EUA, por sua vez, já deixaram claro que não imporão quaisquer consequências materiais a Israel caso invadam Rafah  e estão portanto cientes de que tal operação implicaria em mortes em massa e significaria o fim das já limitadas  missões de ajuda humanitária em Gaza. O objetivo de Israel é provocar uma expulsão em massa de pessoas de Gaza para a Península do Sinai, no Egito, onde tem havido recentemente uma  limpeza de terras e obras  como  preparação  para conter uma população forçada a sair da Faixa. Formalmente o  governo Biden se opõe a isso, com Kirby dizendo que “não queremos ver Gaza ocupada, não queremos ver nenhum território de Gaza reduzido e não queremos ver nenhum deslocamento forçado do povo palestino”.

O ministério da Inteligência de Israel tem, no entanto, recomendado a “evacuação da população civil de Gaza para o Sinai”, única solução depois que as forças armadas de Israel  destruíram totalmente a infraestrutura civil e empurraram a população para   a região de Rafah . E o plano “pós-Hamas” recentemente revelado pelo gabinete de guerra israelense exige o controle militar direto indefinido do território.

O plano de Netanyahu prevê que o governo civil em Gaza seja gerido por “elementos locais com experiência de gestão” que sejam independentes de “países ou entidades que apoiem o terrorismo” – aparentemente uma tentativa de reeditar as Ligas de Aldeia que pretendiam combater a influência revolucionária da Organização para a Libertação da Palestina nas décadas de 1970 e 80.

O plano de Biden, por outro lado, prevê uma força internacional em Gaza e a extensão da governança de uma Autoridade Palestina “revitalizada” ao território, o que Netanyahu e membros de seu governo de extrema direita rejeitam. O que os planos de Netanyahu e Biden têm em comum é a presunção de que Israel de fato removerá o Hamas do poder  em Gaza,   o que é praticamente impossível.

Netanyahu e o governo Biden também manifestam total desprezo  pela opinião dos  palestinos sobre como eles desejam se organizar e governar  negando totalmente a possibilidade de autodeterminação que está no centro da luta de libertação nacional palestina. Kirby disse que “pedir um cessar-fogo geral agora, sem pré-condições, beneficia o Hamas e os deixa no comando, e eles não precisam pagar nenhum preço pelo que fizeram em 7 de outubro”. Esse “pagamento” que  seria um dos objetivos estratégicos de Washington em Gaza favorece a ideia de que a fome seria um instrumento necessário para forçar uma possivel rendição do Hamas, algo que todos sabem que não vai acontecer.

Um exemplo desta  política criminosa é o que ficou conhecido como o Massacre da Farinha – o fuzilamento pelas Forças Armadas de Israel de  118 palestinos e centenas de feridos com os tanques avançando e atropelando mortalmente os palestinos, com requintes de violencia dignos do exercito nazista de Hitler na invasão da União Soviética durante a 2ª. Guerra mundial.

Esse massacre resultou claramente de ordens expressas do Gabinete de Guerra de Nethanyahu, que tentaram transformá-lo em um “incidente”, falsificando até mesmo as imagens do ocorrido , cujo video foi comprovadamente editado.Não há dúvida que o pretendido o controle direto israelense da Faixa de Gaza pós fim do massacre será cheio de “incidentes” como esse pois há provas de que o governo de  Israel teria direcionado o comboio de caminhões de ajuda transportando farinha e outros alimentos e suprimentos e convocado empresários palestinos para entregá-lo, com três entregas desse tipo ocorrendo nos dias que antecederam o massacre. Durante a entrega de 29 de fevereiro, as tropas abriram fogo contra a multidão, no que a Al Jazeera relatou como “duas explosões, a primeira quando as pessoas carregavam as mercadorias e a segunda quando a multidão voltou para os caminhões”. A emissora, citando o repórter Ismail al-Ghoul, que estava presente, disse que “depois de abrir fogo, tanques israelenses avançaram e atropelaram muitos dos mortos e feridos”.

A desculpa para Israel ter organizado o comboio de ajuda seria a tentativa de preencher um vazio  depois  que as Nações Unidas foram forçadas a suspender as missões de ajuda ao norte de Gaza devido à falta de segurança – uma situação resultante das próprias ações de Israel. De acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários, ‘”os parceiros humanitários têm sido incapazes de chegar ao norte de Gaza e cada vez mais a partIir do sul de Gaza com segurança, já que os comboios de ajuda têm sido atacados e são sistematicamente impedidos de suprir  as pessoas necessitadas”.

Os comboios de ajuda humanitária não só ficaram sob fogo israelense e tiveram o acesso negado, como também foram interceptados por multidões de pessoas desesperadas e elementos criminosos que tentam explorar a situação  no trajeto do sul  para o norte de Gaza , onde a  fome é generalizada. Israel promoveu um ambiente de terror ao atacar e matar quase uma dúzia de policiais palestinos que protegiam passagens de fronteira e os próprios comboios de ajuda, forçando a polícia a parar de escoltar caminhões de ajuda, enquanto culpava as agências humanitárias por sua incapacidade de distribuir ajuda de forma eficaz. Dois dos policiais mortos eram responsáveis pelo lado palestino das principais travessias de Gaza. Bassem Ghaben, diretor do lado de Gaza da travessia comercial de  Kerem Slalom/Karem Abu Salem, foi morto junto com outras três pessoas em 21 de dezembro no que os palestinos disseram ser um ataque aéreo israelense visando a travessia que havia sido reaberta dias antes.

Semanas depois, em 7 de fevereiro, o oficial sênior Majdi Abd al-Aal, chefe do lado de Gaza do posto fronteiriço de Rafah com o Egito, foi assassinado em um ataque israelense junto com vários outros policiais. Autoridades palestinas disseram que Abd al-Aal, membro do Hamas, foi morto enquanto protegia caminhões de ajuda.

O governo Biden sabia que não havia ninguém capaz de fornecer segurança aos comboios de ajuda. A falta de escolta policial tornou “virtualmente impossível para a ONU ou qualquer outra entidade (…) transportar com segurança a assistência em Gaza por causa de gangues criminosas”, disse o embaixador dos EUA, David Satterfield, em fevereiro. A ausência de policiais também tornou a situação mais insegura para os palestinos e agora homens armados e mascarados estão patrulhando Rafah para reprimir o aumento de preços.

O Comboio da guerra

Apesar da condenação mundial do Massacre da Farinha, inclusive por alguns dos aliados mais ferrenhos de Israel, os militares voltaram a abrir fogo contra palestinos reunidos para receber assistência no norte de Gaza, como fizeram em pelo menos 14 ocasiões entre meados de janeiro e o final de fevereiro.

Em 5 de março, o Programa Mundial de Alimentos disse que uma nova tentativa de retomar as entregas para o norte de Gaza não foi bem-sucedida. Um comboio de alimentos de 14 caminhões foi recusado em um posto de controle israelense após uma espera de horas. Quando foi obrigado a voltar sem liberar os alimentos “uma grande multidão de pessoas desesperadas (…) saquearam os alimentos, levando cerca de 200 toneladas”, segundo a agência da ONU.

Há testemunhos de palestinos no norte de Gaza que receberam telefonemas dos militares israelitas antes do Massacre da Farinha, durante os quais lhes foi dito “clara e explicitamente para se deslocarem para as seções central e sul da Faixa de Gaza, a fim de obter comida e água e evitar a morte por fome”.

                Três importantes grupos palestinos de direitos humanos – Al-Haq, Al Mezan e o Centro Palestino de Direitos Humanos – afirmaram que “milhares de palestinos arriscam suas vidas todos os dias em busca de suprimentos alimentares essenciais, como farinha, perto de postos de controle israelenses onde caminhões de ajuda devem chegar”. Apesar da “plena consciência das circunstâncias impostas por eles, os militares israelenses têm como alvo os indivíduos que esperam por horas para garantir suprimentos de alimentos para suas famílias famintas”. A política de fome de Israel visa obrigar os palestinos no norte de Gaza a “sair para o sul”, acrescentam os grupos de direitos humanos, e “potencialmente expulsá-los à força” para o Egito. “

A fome como estratégia de “negociação”

Os militares israelenses não apenas veem a ajuda humanitária como um aspecto fundamental de sua estratégia de guerra, mas também veem a fome que projetaram no norte de Gaza como uma moeda de troca nas negociações com o Hamas sobre um acordo de libertação de reféns.. Uma proposta analisada pelo Hamas nos últimos dias inclui um compromisso de 500 caminhões por dia de ajuda humanitária, o fornecimento de 200.000 tendas e 60.000 caravanas e permitir a restauração de hospitais e padarias em Gaza.

A proposta de trégua de 40 dias estipula que  permitirá que 500 caminhões de ajuda humanitária entrem em Gaza diariamente, mas não contém menção a um cessar-fogo permanente, uma retirada total de suas tropas, um levantamento de seu cerco ou um retorno de todos os civis ao norte, como exigido pelo Hamas. A fome deliberada dos palestinos permitiu que Israel criasse novos fatos no terreno e baixou o teto das negociações para meramente desacelerar a fome, que agora pode reivindicar como uma grande concessão. Um colapso social serviria à narrativa de Israel para seu cenário imaginado de pós-guerra em Gaza, no qual o Hamas seria removido, mesmo sendo o único partido capaz de restaurar a lei e a ordem. Isso daria a Israel controle total, direto ou indireto, sobre um caos em  Gaza, fazendo com que todos aceitassem uma administração colonial.

No final de janeiro, a Corte Internacional de Justiça decidiu que Israel estava cometendo um genocídio em Gaza e ordenou que permitisse a entrega imediata e efetiva de serviços básicos e ajuda humanitária aos palestinos no território. Em janeiro, antes da decisão do tribunal, uma média de 147 caminhões entravam em Gaza todos os dias.Desde que a decisão foi emitida, apenas 57 caminhões entraram em Gaza entre 9 e 21 de fevereiro de 2024.E desde a decisão da CIJ, os aliados de Israel liderados pelos EUA suspenderam o financiamento à UNRWA, a agência da ONU para refugiados palestinos, após alegações falsas de que alguns de seus funcionários estavam envolvidos nos ataques de 7 de outubro – desferindo assim um golpe de morte potencial para o maior provedor de ajuda humanitária em Gaza.

Imperialismo: cúmplice ou mentor?

Os EUA aparentemente admitiram ser cúmplices e endossar o uso da fome como arma de guerra em Gaza. Os EUA reconhecem que os ministros israelenses estão bloqueando a entrega de ajuda, incluindo assistência humanitária fornecida pelos EUA, e que sua obstrução é uma questão de política deliberada, em vez de resultar de um problema técnico ou desafios logísticos que poderiam ser esperados ao distribuir assistência em uma zona de guerra. De acordo com o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, os ministros do governo israelense bloquearam a liberação de farinha do porto de Ashdod.  Os protestos de israelenses contra a ajuda humanitária foram organizados, segundo Miller, por ministros do governo Netanyahu . A lei americana proíbe a assistência a países que proíbam ou restrinjam a prestação de assistência humanitária fornecida pelos EUA. Mas o governo Biden não disse se está avaliando formalmente se Israel está em conformidade com a lei dos EUA.

Os protestos a que Miller se referiu, pelos quais cidadãos israelitas bloquearam a transferência de ajuda na passagem Kerem Shalom/Karem Abu Salem durante mais de um mês, foram organizados por Andy Green (também conhecido como Baruch Ben Yosef), um cidadão norte-americano suspeito do assassínio de Alex Odeh, em 1985, um líder palestino-americano dos direitos civis.

Washington se recusa a usar sua grande  influência sobre Israel para liberar as travessias, remover a burocracia administrativa e garantir a proteção dos comboios de ajuda – medidas urgentemente necessárias para atender às necessidades básicas dos palestinos em Gaza, que sobreviveram a cinco meses de ataques constantes com armas de origem americana.

Em vez disso, o governo Biden agora está participando de lançamentos aéreos meramente teatrais de ajuda a Gaza e anunciou que construirá um porto temporário em sua costa, embora a ONU diga que o que é necessário são mais entregas de ajuda por terra e em maior volume. Há inclusive rumores que que o porto serviria também para a expulsão dos palestinos de Gaza para o mar.

Ao longo do genocídio em Gaza, os EUA usaram a ajuda humanitária para encobrir sua cumplicidade. O porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, afirmou que “são os Estados Unidos da América, não qualquer outro país, que conseguiram garantir um acordo para levar assistência humanitária a Gaza”, omitindo que foram os EUA que deram a Israel as armas e a impunidade que lhe permitem levar a cabo um genocídio.

O governo Biden disse que “muitos palestinos inocentes foram mortos” em Gaza e pediu a Israel que permita mais ajuda “através do maior número possível de pontos de acesso e permita a distribuição segura dessa ajuda em Gaza”. Mas os líderes israelenses deixaram claro no início da ofensiva que usariam comida e água como armas de guerra contra toda a população de Gaza. Cinco meses depois, suas “escolhas de métodos e meios de guerra causaram uma catástrofe humanitária”, segundo o escritório de direitos humanos da ONU.

As agências humanitárias dizem com unanimidade que apenas um cessar-fogo permitirá a operação de socorro maciça necessária para evitar a fome em Gaza. O fornecimento de alimentos foi cortado deliberadamente. Não nos esqueçamos disso.

De acordo com Michael Fakhri, relator especial da ONU sobre o direito à alimentação, os palestinos em Gaza “agora representam 80% de todas as pessoas que enfrentam fome ou fome catastrófica em todo o mundo”. “Desde a Segunda Guerra Mundial, nunca vimos uma população civil inteira passar fome tão completa e rapidamente”, acrescenta Fakhri.

A fome pode vir a ser a arma mais mortífera na guerra de aniquilação de Israel contra o povo palestino em Gaza, a destruição de suas vidas ajudada, incentivada e prolongada pelos EUA. O imperialismo, dessa forma, não está minimamente comprometido com qualquer “opção civilizada” para o fim do genocídio em gaza. Na verdade, a estratégia geral no enfrentamento aos palestinos foi obra do imperialismo, com seus think tank totalmente envolvidos na idéia da limpeza étnica de Gaza. A estratégia do   Hamas, de não aceitar mais pausas humanitárias, e impulsionar a luta de todos os palestinos contra as forças de ocupação está correta. É impossível, neste contexto de uma ação bárbara e sem qualquer escrúpulo por parte de Israel e EUA, acreditar que a negociação tenha alguma base real, e que o prometido vai ser cumprido.                 É preciso que haja uma ação internacional coordenada contra Israel, rompendo relações diplomáticas e secando completamente as fontes de financiamento deste monstro assassino que se tornou Israel. No Brasil, já passou a hora do governo brasileiro expulsar o embaixador bolsonarista de Israel e romper toda relação diplomática, econômica e comercial com o país. Anuncia-se para breve uma enorme licitação de material militar, no valor de um bilhão de reais, pelas forças Armadas brasileiras , na qual está concorrendo uma firma  israelense. É fundamental que a citada firma seja desqualificada e não seja, portanto, vencedora dessa licitação. Essas são algumas medidas eficazes que, se tornando generalizadas por todos países, podem fazer parar o genocídio em Gaza, mesmo com a continuidade do apoio a Israel por parte d

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